23 de jan. de 2012

Pinheirinhos, a verdade

Blog do Pachá - Minha posição quanto às questões sociais é bem clara; simplificando meu pensamento sempre serei favorável a uma distribuição justa de renda e condições dignas a toda a população. No entanto dizer isso já tornou-se um clichê e é nos momentos de confronto social que as posições ficam evidentes.

Algumas pessoas dizem não ter opinião formada e esperam alguém escrever uma crônica bonita falando mal da polêmica em torno do assunto. Aí caem de pau partilhando a crônica que definiu suas posições pelo Facebook ou em correntes de e-mails. Outros atacam agressivamente movimentos sociais sem sequer ouvir suas reivindicações. Criminalizam quaisquer revoltas populares. Não percebem que geralmente para haver quórum para um movimento organizado é porque há uma causa em comum àqueles cidadãos que se organizaram. E para chegarem a esse ponto, na maior parte das vezes, aquelas pessoas já tentaram e não conseguiram ter algum direito social atendido.

Mas seria muito errado generalizar as posições pessoais como se todas as pessoas seguissem cartilhas doutrinárias. Eu, por exemplo, não sou filiado a nenhum partido e não pretendo nunca me filiar, pois há uma necessidade em mim de liberdade para mudar de opinião sempre que achar justo. Por isso não quero aceitar cegamente opiniões alheias. Não posso negar, no entanto, que meu conceito de Justiça passa sim pelas reivindicações de muitos movimentos sociais e um deles é o dos trabalhadores sem teto.

Mais da metade das poucas pessoas que começaram a ler o post já abandonaram a leitura até aqui - tenho certeza. Uma pena, pois vou embasar meu texto em fatos para demonstrar minha posição. Primeiramente há no Brasil, de acordo com dados de 2011 da Câmara dos Deputados um déficit habitacional de 5,5 milhões de habitações. Considerando 4 a 5 pessoas em cada habitação a necessidade é para entre 22 e 27,5 milhões de pessoas de acordo com os dados oficiais.

O site Transparência São Paulo diz que neste estado há uma carência de habitação para 5 milhões de habitantes e, além disso 6,2 milhões vivem em áreas ainda não regularizadas e sem as mínimas condições de habitabilidade. Seriam necessários 60 anos de políticas públicas adequadas para zerar esse déficit no estado.

Na cidade de São José dos Campos em 2004 uma área de 1 milhão e 300 mil metros quadrados completamente vazia foi ocupada por pessoas que faziam parte das estatísticas do governo. Gente que não tinha condições dignas de moradia ou que moravam longe demais dos grandes centros e por isso perdia oportunidades de trabalho, além de dinheiro e tempo com os transportes públicos.

Uniram-se aos ocupantes 300 moradores que haviam sido despejados de outra ocupação ali perto, a do Campo dos Alemães. Outra ocupação que teve seus moradores despejados com a promessa do governo de uma moradia digna em outro lugar.

Cerca de 7 mil pessoas de acordo com a Polícia Militar e mais de 10 mil de acordo com os militantes habitaram o lugar. Lá se estabeleceram, construíram e ampliaram suas casas, tiveram filhos, montaram comércios, trabalharam. Nos últimos 8 anos deram ao lugar uma função social prevista na Constituição Federal.

O enorme terreno, no entanto, pertence à massa falida de uma das empresas fantasmas de Naji Nahas; a Selecta S/A, que deve R$15 milhões só em impostos à prefeitura de São José dos Campos e nunca teve sequer 1 funcionário, de acordo com O Observador Político.

Naji Nahas, que não é permitido de pisar em nada mais nada menos do que 40 países por conta de seus crimes internacionais, ficou conhecido no Brasil depois de quebrar a Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. Ele captava empréstimos em bancos para suas empresas fantasmas e investia os empréstimos na Bolsa através de laranjas que recebiam um percentual do lucro. É uma forma de fazer negócios consigo mesmo e se blindar de prejuízos. Lucro certo que foi parar entre outros na conta do ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta.

Depois descobriu-se o envolvimento de outras figuras públicas nas negociatas de Nahas. Pitta, Daniel Dantas, Salvatore Cacciola e outros bandidos foram desvelados através da Operação Satiagraha da Polícia Federal, que atualmente é também tema de investigação por ter vazado dados para a Rede Globo ainda durante a apuração. Para entender mais das negociatas mencionadas veja o infográfico feito pela equipe UOL.

Pois bem, no final de dezembro a decisão judicial saiu e foi favorável ao despejo. Desde então começou uma guerra entre entidades judiciais favoráveis ao despejo das famílias e destruição de tudo que foi construído no terreno e entidades favoráveis ao uso constitucional das terras. Depois de alguns atos de violência policial e muito terror psicológico às famílias chegou a ordem que parecia definitiva.

Uma ordem suspendendo a reintegração de posse foi assinada por um juíz federal, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo disse que é independente. Por isso a OAB disse haver uma quebra do pacto federativo e o ministro da Justiça José Eduardo Cardozo revelou ter sido surpreendido pela decisão unilateral paulista.

De acordo com o portal R7, o juiz Rodrigo Capez, que responde pela presidência do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) afirmou neste domingo que o Tribunal de São Paulo e o Tribunal Regional Federal são hierarquicamente equivalentes e a decisão de um não pode se sobrepor à do outro. Rodrigo Capez é irmão do Deputado Estadual pelo PSDB Fernando Capez.

Por volta das 6h da manhã de domingo cerca de 2 mil policiais militares chegaram enquanto a maioria da população dormia à região para, com força desproporcional desalojarem as 1600 famílias. Sindicatos próximos também foram cercados para não mandarem apoio, líderes comunitários sumiram temporariamente e deputados e vereadores simpatizantes à causa foram isolados pela polícia de acordo com o Vírus Planetário. Além dos policiais guardas municipais de São José dos Campos foram à batalha com armas de fogo e usando luvas de borracha (para no caso de uma eventualidade não ser identificado o autor do disparo).

Celulares e máquinas fotográficas foram apreendidos também. Os relatos são de espancamentos e até mortes. Polícias de 33 municípios foram convocadas para esta barbárie, de acordo com o Diário Liberdade. Militantes falam em até 8 mortos. Nenhuma morte foi noticiada até agora na grande mídia.

Há informações contraditórias de que políticos como o deputado Ivan Valante (PSOL), o senador Eduardo Suplicy (PT) e o líder socialista Zé Maria (PSTU) foram isolados pelas forças de repressão na Escola Edgar, que posteriormente foram desmentidas pelas assessorias de imprensa dos parlamentares que afirmaram que estavam em negociação na escola. Parte da imprensa afirma que o senador Suplicy não esteve no Pinheirinho domingo, e sim no sábado, mas o UOL confirma a detenção. Há jornalistas que confirmam que os políticos e os professores Almir Bento Freitas e Lourdes Quadros Alves também foram detidos na Escola Edgar. Almir e Lourdes são diretores do Sinpeem (Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo). Os deputados federais Paulo Teixeira (PT) e Carlinhos Almeida (PT) também foram ao local tentar uma negociação.

A Folha de SP mostra as condições deploráveis dos "abrigos" para onde foram mandados os desalojados. Duas tendas sem parede. Uma delas com chão de terra. Como choveu na cidade esse domingo a terra virou lama. Policiais jogam bombas de gás com frequência nas pessoas que estão dentro das lonas. Os depoimentos dados ao Estadão são lamentáveis e bastante reais. A reportagem parecia boa, mas o Estadão quis fazer juz à fama e terminou falando do trânsito causado pelos manifestantes.

O ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência) disse neste domingo que a ação "atropelou" as negociações para a desocupação pacífica do local. Um dos assessores do ministro, inclusive, que estava no terreno, foi atingido com uma bala de borracha na perna, de acordo com a Folha. E o governador Alkmin elogiou a ação policial para a CBN.

Isso aqui descrito são os fatos ocorridos, recolhidos de diversas fontes. A maior parte da grande mídia, que foi de onde eu tirei minhas informações, prefere dar ênfase ao carro da afiliada da Globo pegando fogo. Mesmo supondo que foram os moradores da ocupação que tacaram o fogo nos carros é difícil condenar quem não tem direitos no dia-a-dia e que a mídia só mostra como bandidos. Esse vídeo mostra quem são os grandes bandidos de Pinheirinhos:

O Estado é quem decide o que fazer com o terreno que pertence à massa falida de uma corporação. Seria mais barato e, incontestavelmente mais fácil ao Estado investir na região ocupada, que até asfaltada e com áreas de lazer e para a prática de esportes já estava. Seria melhor investir no desenvolvimento da região e das pessoas que ali moravam e trabalhavam do que procurar agora reduzir as taxas de desemprego e o déficit habitacional que vão aumentar por conta do despejo. Seria mais humano promover a ordem a Pinheirinhos e a seus moradores que já tinham ali uma vida construída do que implantar o terror de Estado com a truculência a essas famílias sem deixar sequer que retirassem seus pertences civilizadamente como pode ser visto nos vídeos. Depois ninguém sabe porque a população não se sente representada pelo Estado.

"Estávamos junto à população de Pinheirinho refugiados numa Igreja, a polícia pela rua da frente inúmeras vezes atacando bomba e muitos tiros para intimidar ainda mais a população. Eis que chega a Polícia Federal com o Secretário Nacional de Direitos Humanos. Pelo menos por algumas horas a população respirará sem tanto medo. Triste história." (Nathalie Drumond, do Pinheirinho)

"Em São José dos Campos. Um dos dias dias mais revoltantes (se não o mais) da minha vida. Milhares de pessoas andando a esmo no entorno do Pinheirinho, com suas malas, pertences, filhos, bichos de estimação... para onde vão?

Como aceitar que suas casas (já de alvenaria, nas quais investiram cada pouquinho que podiam para construir), seus lotes (com flores, árvores) vão ser completamente destruídos para que aquele terreno volte a ser o que era: NADA. Um buraco vazio no meio de uma cidade, para favorecer a especulação imobiliária. é muito importante que façamos a pergunta: a quem essa atrocidade favorece?

A quem favorece a política de terrorismo da PM de São Paulo? Não se poder andar na rua do seu próprio bairro porque a qualquer momento uma viatura (de quem supostamente te protege) vai virar a esquina e te meter uma saraivada de balas de borracha.

Acabamos de voltar da igreja próxima ao Pinheirinho. São milhares de pessoas lá... pergunto de novo. Para onde elas vão? Elas estão paradas no meio da rua e não têm a quem recorrer."

(Maia Fortes, do Pinheirinho)

Fonte: Diário Liberdade

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