27 de mar. de 2011

OS TEMPOS MODERNOS DE CHAPLIN: TRABALHO E ALIENAÇÃO NA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL

Sérgio A. M. Prieb*
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“Não sois máquina! Homens é que sois!”
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(Discurso de Charles Chaplin no final do filme “O grande ditador”)

A origem da palavra trabalho tem sido comumente atribuída ao latim tripalium, instrumento de tortura utilizado para empalar prisioneiros de guerra e escravos fugídios. Assim, em sua própria terminologia o trabalho carrega uma carga de esforço e desprazer, o que é extremamente compreensível em sociedades em que predominavam o trabalho forçado em que atividades produtivas eram desprezadas e executadas tão somente por escravos como na Grécia e Roma antigas, cabendo aos homens livres a execução de atividades intelectuais ligadas às ciências e às artes.
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Pode-se afirmar que o trabalho é o ato que o homem executa visando transformar conscientemente a natureza, ou para citar Marx (1983, p. 149), é uma ação em que o homem media, regula e controla seu metabolismo com a natureza. A origem do trabalho encontra-se na necessidade de a humanidade satisfazer suas necessidades básicas, evoluindo para outros tipos de necessidades, mesmo supérfluas. Assim, trabalhar é produzir riqueza, o que é necessário em todos os modos de produção, seja no comunal primitivo, no escravista, no feudal, no capitalista, e mesmo nas experiências socialistas. O que muda é a forma de produzir, a tecnologia utilizada, e a relação entre o sujeito que produziu e o que se apropria do que foi produzido, que varia de acordo com a forma de organização da sociedade1.
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Uma sociedade não vive sem o trabalho, na verdade, pode-se dizer que o homem evoluiu de sua condição animal até sua condição atual devido ao seu trabalho2. Engels (s/d, p. 270) afirma que o homem modifica sua relação com a natureza devido ao trabalho. Se na condição animal ele tinha de submeter-se às leis da natureza, através do trabalho ele busca dominar a natureza, transforma-a em proveito próprio. Passa de ser dominado a ser dominante devido ao desenvolvimento do trabalho.
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O próprio desenvolvimento do seu corpo, do cérebro, da fala, e da relação entre os homens origina-se do trabalho. Desta forma, Engels afirma que o trabalho criou o homem e o homem criou o trabalho, sendo esta uma ação exclusivamente humana, pois assume uma forma consciente, não intuitiva, pois antes de produzir um objeto é necessário ao trabalhador elaborá-lo inicialmente em seu cérebro para só então partir para a execução. Já as atividades que os animais executam (a aranha e sua teia, o joão-de-barro e sua casa) são meramente intuitivas, daí trabalho ser uma atividade exclusiva da espécie humana.
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Para Marx, o único bem que o trabalhador possui devido a não ser proprietário de meios de produção é a sua força de trabalho, a sua capacidade de trabalhar, sendo por isso que o trabalhador é obrigado a vender sua força de trabalho ao capital. Ao contrário de sociedades pré-capitalistas como o feudalismo e a escravidão, no capitalismo o trabalhador entrega sua capacidade de trabalhar por um tempo determinado através de um contrato de trabalho.
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Além do estabelecimento de um contrato de assalariamento que regula as relações capital-trabalho, algumas diferenças podem ser encontradas no trabalho sob o modo de produção capitalista em comparação com sociedades pré-capitalistas. Como já visto, o trabalho era desprezado na Grécia e Roma antigas, fazendo com que a socialização dos indivíduos ocorresse fora do trabalho, enquanto na sociedade capitalista a socialização dos indivíduos ocorre exatamente nas relações de trabalho. Para esta mudança, a revolução industrial dos séculos XVIII e XIX teve um peso determinante3, com a formação de exércitos de trabalhadores que desprovidos de qualquer propriedade são obrigados a abandonar a vida do campo, sendo jogados nas cidades em busca de empregos assalariados junto às nascentes indústrias.
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O trabalho então assumiria um novo caráter, de atividade indigna no passado, passam a ser vistos como indignos aqueles que não trabalham, taxados como vagabundos os que não se submetem a trabalhar para o capital4, mesmo que o próprio capital não tenha interesse em absorver todo o trabalho posto à sua disposição. Assim, os capitalistas sempre encontram um grupo de trabalhadores à margem do processo produtivo, mas sempre ávidos por incorporar-se a ele, a estes trabalhadores Marx denominou de “exército industrial de reserva”.
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Em “Tempos modernos” (“Modern times”), filme de Charles Chaplin5 de 1936, o diretor mostra com maestria os efeitos que o desenvolvimento capitalista e seu processo de industrialização trouxeram à classe trabalhadora. Como diz o texto de introdução do filme, “’Tempos modernos’ é uma história sobre a indústria, a iniciativa privada e a humanidade em busca da felicidade”6.
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A temática de “Tempos modernos” custou a Chaplin uma série de perseguições por parte da CIA, juntamente com a acusação de simpatias comunistas7. Além disso, havia recusado naturalizar-se norte-americano argumentando ser um “cidadão do mundo” o que agrava ainda mais sua situação. Chaplin passa a constar na “lista negra” de Hollywood durante a perseguição macarthista, o que torna sua situação de trabalho nos EUA insustentável (seus filmes eram proibidos), levando-o a abandonar definitivamente os EUA em 1952.
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No filme, o vagabundo Carlitos, ironicamente, encontra-se na condição de operário. É ao auge do predomínio do padrão de acumulação taylorista-fordista, em que os trabalhadores tem suas habilidades substituídas por um trabalho rotineiro e alienado. É o predomínio da esteira rolante de Ford, do cronômetro de Taylor8, do operário-massa.
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A inadequação de Carlitos com o trabalho alienado perpassa o tempo todo do filme. Na condição de operário ele tenta se adaptar, se esforça para inserir-se naquele novo mundo de produção em massa, máquinas gigantescas, exploração do trabalho, mas também de greves e de organização sindical. Esta inadequação fica presente logo no início do filme, quando um bando de ovelhas brancas é mostrado e apenas uma delas tem a cor preta, certamente esta representa o próprio Carlitos. A cena do bando de ovelhas é misturada com a cena dos operários entrando na fábrica, como se fossem animais indo para o abate, só que, na verdade, vão para a produção na fábrica.
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Como operário da fábrica, Carlitos se depara com a esteira de produção fordista que aumenta o ritmo de produção a todo instante, tornando a relação homem-máquina extremamente conflituosa, até o ponto em que o próprio Carlitos é engolido pela máquina, saindo de lá em uma condição de insanidade, momento em que ele abandona a condição de quase um autômato (repetindo um gesto mecânico mesmo quando não está trabalhando, fruto da alienação do trabalho) para uma situação de confronto direto em que ele sabota a produção, insurge-se contra o patrão e é internado como louco.
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A contradição capital-trabalho está presente de forma clara no filme. O patrão fica numa sala armando quebra-cabeças e lendo jornal, ao mesmo tempo em que de um monitor controla todos os movimentos dos operários e dita o ritmo de produção a ser executado9.
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Em outras passagens, a inadequação de Carlitos com o trabalho alienado fica presente nas tantas tentativas de trabalhar que o personagem enfrenta. Quando arranja trabalho no caís após sair do hospício, consegue em um simples gesto lançar um navio ao mar. Quando o personagem vira vigia na loja de departamentos, além, de não conseguir impedir um assalto, consome produtos da loja, leva a amiga para o interior da loja, e dorme no serviço. Trabalhando como auxiliar de mecânico, Carlitos demonstra a todo instante sua inadequação com a simples tarefa de ajudar o mecânico chefe, fazendo com que este seja também engolido pela máquina. Quando assume o papel de garçom, também é nítida a sua incapacidade de servir uma mesa.
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Na verdade, Carlitos só consegue mostrar sua identificação com atividades nada alienantes e que fogem ao domínio da máquina sobre o trabalho. Quando ele está na loja de departamentos e mostra uma grande habilidade em patinar, e quando está no restaurante trabalhando como garçom e que improvisa um número musical cômico. Neste momento percebe-se que em ao menos em uma atividade ele é bom, em um tipo de trabalho que requeira criatividade e não uma mera execução de tarefas formulada por terceiros. Só então, ele é aplaudido por todos e inclusive, parabenizado pelo patrão10.
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A voz de Carlitos é ouvida pela primeira vez no cinema quando ele canta. Chaplin opunha-se ao cinema falado, achando que este não duraria muito tempo. Na verdade, seu temor era com seu próprio personagem, adequado muito mais ao gestual do que a fala. Somente depois de 10 anos de existência, é que em “Tempos modernos”, Chaplin faria sua primeira experiência com o cinema falado, ou no seu caso, “semi-falado”. Ouve-se o ruído das máquinas, o som mecânico da “máquina de comer”, do alto-falante em que o patrão dirige-se aos funcionários, mas em nenhum momento um personagem fala, que não seja através de uma máquina11.
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Mesmo quando Carlitos canta ele expressa uma crítica ao cinema falado, quando esquece a letra, sua amiga12 grita a ele: “Cante! Dane-se a letra!”, e é o que ele faz, mostra que mesmo sem palavras, ou no caso, usando palavras sem sentido, mas caprichando no gestual, faz com que todos consigam compreender uma história13.
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Outro aspecto que chama atenção no filme é o predomínio completo do trabalho abstrato sobre o trabalho concreto14, ou seja, ao capital não interessa a forma como está sendo produzido ou que está sendo produzido, somente importa é que está sendo criado valor. Daí não sabermos exatamente qual a mercadoria que Carlitos produz, e certamente, nem mesmo os operários da fábrica o sabem. Assim, não existe qualquer identificação do trabalhador com seu trabalho, nem com a mercadoria produzida por ele.
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Mesmo com toda a crítica social que é feita, a reação do personagem Carlitos ao sistema é feita de maneira individual e não coletiva. Quando eclode a Grande Depressão de 1929, que coincide com a saída do personagem do hospício, é levado à prisão acusado de ser líder comunista por empunhar uma bandeira (pretensamente vermelha) em frente a um grupo de trabalhadores que fazia uma passeata na rua. Carlitos é visto como o cidadão comum, não politizado, mas que pelo simples gesto de buscar devolver a bandeira que tinha caído do caminhão é acusado de líder da revolta operária. Em outro momento, quando eclode uma greve na fábrica em que trabalha, também por acidente é acusado de agressão a um policial que viria reprimir a greve.
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No final do filme, quando sua amiga indignada com a situação de perseguição, miséria e desemprego pergunta: “para que tudo isso?” ele responde: “levante a cabeça, nunca abandone a luta”. No entanto, a reação dos dois não é o enfrentamento contra o capital, é retirar-se da cidade, indo em direção ao campo15.
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Ao som da belíssima “Smile”, de autoria de Chaplin, Carlitos dá as costas para a produção em massa, para as gigantescas máquinas que desempregam trabalhadores, para as suntuosas lojas com suas escadas rolantes, para o trabalho alienado. Seria o último filme mudo de Chaplin e também a despedida do personagem Carlitos, que havia se tornado obsoleto em um momento em que o cinema falado tomava conta dos cinemas do mundo todo. Era o sinal dos tempos. Os tais “tempos modernos”.
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Referências bibliográficas
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BRAVERMAN, Harry. Trabalho e capital monopolista – a degradação do trabalho no século XX. Rio de Janeiro: Guanabara, 1987.
CHAUÍ, Marilena. Introdução. In: LAFARGUE, Paul. O direito à preguiça. São Paulo: Hucitec, 1999.
CLARET, Martin. Chaplin por ele mesmo. São Paulo: Martin Claret, 2004.
ENGELS. Friedrich. Sobre o papel do trabalho na transformação do macaco em homem. In: MARX, Karl. e ENGELS. Friedrich. Obras escolhidas, volume 2. São Paulo: Editora Alfa-Omega, s/d.
GOMES, Morgana. A vida e os pensamentos de Charles Chaplin. Rio de Janeiro: 4D Editora, s/d.
LEPROHON, Pierre. Charles Chaplin – o seu destino e a sua obra. Lisboa: Livros do Brasil, s/d.
MARX, Karl. O capital – crítica da economia política – Vol. I, Tomo I. São Paulo: Abril Culural, 1983.
PRIEB, Sérgio. O trabalho à beira do abismo – uma crítica marxista à tese do fim da centralidade do trabalho. Ijuí: Editora Unijuí, 2005.
VÁSQUEZ, Adolfo. Filosofia da práxis. São Paulo: Expressão popular/CLACSO Livros, 2007.

*Professor Adjunto do Departamento de Ciências Econômicas da UFSM. Doutor em Economia Social e do Trabalho pela Unicamp. Membro do Comitê Central do PCB.

1. “Como criador de valores de uso, como trabalho útil, é o trabalho, por isso, uma condição de existência do homem, independente de todas as formas de sociedade, eterna necessidade natural de mediação entre homem e natureza e, portanto, da vida humana” (Marx, 1983, p. 50).
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2. Sobre o papel central do trabalho na sociedade capitalista contemporânea, bem como uma crítica aos autores que acreditam ter o trabalho perdido seu sentido na sociedade moderna, ver Prieb (2005).
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3. Vásquez (2007, p. 47) afirma que mesmo que tenha ocorrido a partir da revolução industrial uma valorização maior do trabalho e da técnica, não chega a despertar uma valorização do trabalhador e da significação de sua atividade produtiva.
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4. “Nesse imaginário, ‘a preguiça é a mãe de todos os vícios’ e nele vêm inscrever-se hoje, o nordestino preguiçoso, a criança de rua vadia (vadiagem, aliás, o termo empregado para referir-se às prostitutas), o mendigo – ‘jovem, forte, saudável, que devia estar trabalhando em vez de vadiar’” (Chauí, 1999, p. 10).
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5. Charles Spencer Chaplin nasceu em 1889 em Londres, Inglaterra, e morreu em 1977 em Vevey, na Suiça.
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6. “O filme custou US$1.500.000 de dólares (somente para fazer a grande máquina que engole Chaplin e Chester Conklin foram gastos 500 mil), mas nos Estados Unidos rendeu apenas US$1.800.000. enquanto a Itália e a Alemanha proibiram sua exibição, em Londres, Paris e Moscou, ele alcançou um sucesso considerável durante o resto do ano” (Gomes (s/d, p. 67).,
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7. Chaplin no início dos anos 30 percorre o mundo divulgando “Luzes da cidade”. Ao retornar publica vários artigos em jornais falando de suas viagens pelo mundo, salientando as contradições que estava encontrando na sociedade moderna, sendo estes artigos a inspiração para “Tempos modernos”. Juntamente com suas idéias sociais, Chaplin defendia que os EUA deveriam parar com a propaganda anti-comunista contra a União Soviética. Mesmo assim, Chaplin nunca declarou-se comunista, sendo que em um telegrama endereçado a Parnell Thomas, da Comissão de Atividades Antiamericanas escreveu: “Dizem que você quer perguntar se sou comunista. Deveria ter-me feito essa pergunta durante os dez dias em que permaneceu em Hollywood. Sobre o que quer saber, não sou comunista. Sou somente um fator da paz” (Claret, 2004, p. 126).
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8. Taylor introduz o cronômetro das atividades produtivas na fábrica, cronometrando todas as fases do processo de produção, buscando que os trabalhadores tornassem seu trabalho mais produtivo. Braverman (1987, p. 97) mostra que em uma experiência de Taylor, ele conseguiu fazer com que um operário aumentasse em 276% a produção, com um simples incremento de 60,86% no salário. O exemplo deveria ser disseminado para os demais operários, mostrando, assim, que era possível aumentar as produtividade se os trabalhadores se empenhassem mais. Existem no filme várias referências à medição do tempo. A primeira imagem do filme é exatamente do relógio da fábrica, que marca a hora da entrada, do almoço, da troca de turno e da saída do trabalho. A todo instante, Carlitos bate o ponto no relógio-ponto da fábrica, mesmo quando está fugindo da polícia. Outras tantas referências irão aparecer no decorrer do filme, Carlitos perde a hora na loja de departamentos, quando dorme demais. Por acidente prensa o relógio de seu chefe imediato na fábrica, além disso, a “máquina de comer” promete que vai “eliminar a pausa para o almoço, aumentar a produção e ultrapassar a concorrência”. A própria realização do filme parecia insurgir-se contra o tempo moderno, sendo rodado de outubro de 1934 a agosto de 1935, um tempo bastante longo para os filme da época..
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9. Esta dissociação entre o trabalho do operário que simplesmente cumpre ordens e não tem qualquer inserção sobre a forma como produz, fica claro em Braverman (1987, p. 53): “Assim, nos seres humanos, diferentemente dos animais, não é inviolável a unidade entre a força motivadora do trabalho e o trabalho em si mesmo. A unidade de concepção e execução pode ser dissolvida. A concepção pode ainda continuar e governar a execução, mas a idéia concebida por uma pessoa pode ser executada por outra.”
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10. Esta inaptidão para outros tipos de trabalho que não o artístico foi presente na vida do próprio Chaplin, que tendo trabalhado como entregador de mercearia, recepcionista de consultório médico, garoto de recados entregador de papelaria, tipógrafo, vendedor e assoprador de vidros, só conseguiu sucesso profissional após tornar-se artista (Gomes, s/d, 11-13).
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11. Em “O capital” Marx afirma que as formas de valor das mercadorias teriam uma “fala própria”: “Vê-se, tudo que nos disse antes a análise do valor das mercadorias, diz-nos o linho logo que entra em relação com outra mercadoria, o casaco. Só que ele revela seu pensamento em sua linguagem exclusiva, a linguagem das mercadorias. [...] Diga-se de passagem que a linguagem das mercadorias, além do hebraico, possui também muitos outros idiomas mais ou menos corretos” (Marx, 1983, p. 57). Marx quer dizer que o capital passa a assumir propriedades que não são suas, mas sim dos homens, ou seja, o capital domina o trabalho, o que é derivado do trabalho passa a ser considerado mérito do capital.
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12. A órfã, amiga de Carlitos no filme, é a atriz Paulette Goddard (1910-1990). Chaplin era 21 anos mais velho que Paulette e ficaria casado com ela de 1932 a 1940.
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13. “Ainda desta vez utiliza um subterfúgio para demonstrar a inutilidade da palavra na sua arte. Mima esta canção e canta-a numa língua imaginária de palavras feitas de sons diversos e onomatopaicos, de tal modo que esta língua, graças unicamente à interpretação do ator (já que o texto é inintelígevel, diverte, interessa e significa” (Leprohon, s/d, p. 205).
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14. Os conceitos de trabalho concreto e trabalho abstrato foram introduzidos por Marx no livro 1 de “O capital” (Marx, 1983). O trabalho concreto produz valores de uso, enquanto o trabalho abstrato produz simplesmente valor.
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15. Chaplin havia gravado outro final para o filme, em que a órfã teria virado freira e Carlitos como em filmes anteriores, terminaria sozinho. Preferiu o final mais otimista, em que os dois personagens ficam juntos.

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21 de mar. de 2011

Justiça decide libertar presos políticos do ato contra Obama

Ato com o grupo será realizado hoje, às 17h, nas escadarias do Theatro Municipal

Cerca de uma hora após o presidente Barack Obama ter deixado o país, a Justiça deu um despacho a favor da libertação dos 13 manifestantes, presos desde a sexta-feira, após protesto no Consulado dos Estados Unidos. O grupo está nos presídios de Bangu 8 e Água Santa e deve ser liberado nas próximas horas. No sábado, um juiz de plantão havia negado a liberdade, alegando que os ativistas representariam uma ameaça ao presidente norte-americano e poderiam "macular" a imagem do Brasil.

Durante o final de semana, uma grande campanha foi feita, com atos e milhares de assinaturas de apoio aos presos. "Estamos aliviados e agradecidos por toda a solidariedade. Foi o que garantiu a liberdade ao grupo. Agora é ver se todos estão bem", comemorou Cyro Garcia, presidente do PSTU, partido que tem 10 militantes presos. Cyro criticou o caráter político das prisões e até na libertação. "Nada vai apagar o que aconteceu. Foi um ataque sem precedentes aos direitos humanos. Obama discursou falando da democracia, comemorando não estarmos mais em uma ditadura, mas o governador deixou pessoas inocentes em presídios até que a viagem terminasse. O governo de Dilma, presa na ditadura, não fez absolutamente nada", afirmou.

O grupo ficou em celas isoladas nos presídios, mas ainda assim, os advogados irão averiguar indícios de maus tratos. "Todos os homens em Água Santa tiveram a cabeça raspada", conta Aderson Bussinger, da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, que acompanha o caso. "Obama veio aqui e deixou um Guantánamo. E ninguém noticiou", completa Cyro.

Uma situação especial é o de Maria de Lourdes Pereira da Silva, de 69 anos. A senhora, que também é conhecida pela torcida do Fluminense como “Vovó tricolor”, pela assiduidade aos jogos, estava passando pelo Centro do Rio, na sexta-feira, quando se juntou ao grupo que dizia “Obama, go home”. Ela terminou presa em Bangu 8 com Gabriela Proença da Costa, estudante de Artes da Uerj, e a professora Pâmela Rossi. Por ironia, o presidente Obama recebeu uma camisa do Fluminense durante a visita a uma escola de samba, no Rio de Janeiro.

Os presos irão deixar o presídio acompanahdos por oficiais de justiça, em ônibus e carros da secretaria de Segurança, em direção ao Instituto Médico Legal, onde farão exames. De lá, seguirão para uma entrevista coletiva, com seus parentes. Em seguida, às 17h, um ato público será feito nas escadarias do Theatro Municipal, onde Obama discursou. "Vamos lavar as escadarias e abraçar os presos", comemora o professor Miguel Malheiros. "Não vamos parar aqui. Também vamos exigir que sejam retirados as acusações, para que não retornem a prisão mais à frente apenas por estarem em um ato pacífico e em defesa do nosso petróleo", completou.

DEPOIMENTO DE PARENTES DOS PRESOS 
 

Repudiamos a prisão dos 13 manifestantes do ato contra Obama! Libertação já!

Como é difícil
Acordar calado
Se na calada da noite
Eu me dano
Quero lançar
Um grito desumano
Que é uma maneira
De ser escutado

(Chico Buarque – Cálice)

Vera Salim, do Coletivo Marxista e do Movimento Universidade Crítica, na manifestação de 20/3: convocação para ato em repúdio às prisões na UFRJ, dia 21/3, às 11h na Faculdade de Letras
O cinismo e a farsa demonstram sua face mais dura e caricata no recente episódio da prisão aleatória e sumária de 13 participantes do ato em protesto à visita de Obama ao Brasil e, especialmente, contra sua política belicista e imperialista, que pretende assinar com o governo Dilma acordos para exploração do pré-sal brasileiro. Palavras de ordem contra a venda do pré-sal, fora as tropas brasileiras e americanas no Haiti e fim ao bombardeio na Líbia foram considerados perigosas demais e, assim, suficientes para que a polícia de Sergio Cabral - que pratica diariamente atos bárbaros de violência e criminalização da pobreza e dos movimentos sociais -, referendada pelo Governo Dilma, ordenassem a prisão indiscriminada de 13 pessoas.

Entre elas, uma senhora de 69 anos! Igualmente brutal é a prisão de um jovem estudante do Pedro II, adolescente que corre risco de violência, colocado sozinho no instituto Padre Severino. Os demais militantes, já de cabeça raspada, numa clara tentativa de humilhação, estão presos em Bangu 8 e Água Santa. É fundamental uma grande campanha pela libertação imediata dos 13 presos políticos e contra a escalada de criminalização dos movimentos sociais, que se sustenta sob o governo do PT.

Atos arbitrários típicos de estado de exceção. Voltamos à ditadura militar com 3 meses do governo Dilma? A América Latina continua com suas veias abertas, agora vertendo etanol, soja e a venda antecipada de nosso pré-sal. A fúria da “democracia americana", ressurge, com toda a sua crueldade: invasão no Iraque e os recentes bombardeios na Líbia são apenas alguns exemplos. Os aliados de ontem, como o ditador líbio Muammar Kadafi, são os inimigos de hoje desde que o controle dos poços de petróleo continue nas mãos do Estados Unidos da América!

Intervenção no Haiti e acordos para venda antecipada do pré-sal são as necessárias faces políticas de governos liberais que procuram, a todo custo, prolongar um sistema econômico baseado nas guerras que alimentam a indústria bélica e da superexploração da classe trabalhadora. Assim, enquanto Obama faz arremedos de embaixadinhas na Cidade de Deus, sob os olhos embevecidos de Sergio Cabral, nossa juventude e trabalhadores são aprisionados.

Mais um ato de violência do governador. Quem não se lembra da violência contra a passeata dos professores e da repressão aos movimentos Sem Teto? É crime gravíssimo contra ordem pública protestar contra os acordos econômicos aqui firmados e corajosamente se manifestar pela necessidade de uma nova política econômica, na qual a riqueza brasileira não fique na mão de 10 grande milionários?

O Coletivo Marxista registra seu repúdio aos governos Dilma e Cabral e à política de extermínio e criminalização dos movimentos sociais, ante-sala do que se espera para os Jogos Olímpicos e para a Copa do Mundo. A tarefa de todos militantes de esquerda é, neste momento, repudiar a postura fascista dos governos Dilma/Cabral e exigir a imediata libertação dos prisioneiros políticos.

LIBERDADE IMEDIATA AOS NOSSOS PRESOS POLÍTICOS

- Pelo cessar-fogo interno e externo na Líbia. Apoio à luta do povo árabe!
- Não à venda do pré-sal!
- Fora as tropas brasileiras do Haiti

- Pela soberania e autodeterminação dos povos

- Pela Unidade Proletária na luta contra o capitalismo
- Lista dos presos políticos:
Gilberto Silva – eletricista
Rafael Rossi - professor de estado, dirigente sindical do SEPE
Pâmela Rossi - professora do estado
Thiago Loureiro - estudante de Direito da UFRJ, funcionário do Sindjustiça
Yuri Proença da Costa - funcionário dos Correios
Gualberto Tinoco "Pitéu" - servidor do estado e dirigente sindical do SEPE
Gabriela Proença da Costa - estudante de Artes da UERJ
Gabriel de Melo Souza Paulo - estudante de Letras da UFRJ, DCE-UFRJ
José Eduardo Braunschweiger – advogado
Andriev Martins Santos - estudante da UFF
João Paulo - estudante Colégio Pedro II
Vagner Vasconcelos - Movimento MV Brasil
Maria de Lurdes Pereira da Silva - doméstica

FONTE: Coletivo Marxista

17 de mar. de 2011

Obama prova que o Brasil é mesmo a casa da mãe Joana

Mauro Santayana

É preciso romper o silêncio da amabilidade para estranhar o pronunciamento público que o presidente Obama fará, da sacada do Teatro Municipal, diante da histórica Cinelândia. Afinal, é de se indagar por que a um chefe de Estado estrangeiro se permite realizar um comício – porque de comício se trata – em nosso país. Apesar das especulações, não se sabe o que ele pretende dizer exatamente aos brasileiros que, a convite da Embaixada dos Estados Unidos – é bom que se frise – irão se reunir em um local tão estreitamente vinculado ao sentimento nacionalista do nosso povo.
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É da boa praxe das relações internacionais que os chefes de estado estrangeiros sejam recebidos no Parlamento e, por intermédio dos representantes da nação, se dirijam ao povo que eles visitam. Seria aceitável que Mr. Obama, a exemplo do que fez no Cairo, pronunciasse conferência em alguma universidade brasileira, como a USP ou a UNB, por exemplo. Ele poderia dizer o que pensa das relações entre os Estados Unidos e a América Latina, e seria de sua conveniência atualizar a Doutrina Monroe, dando-lhe  significado diferente daquele que lhe deu o presidente Ted Roosevelt, em 1904. Na mensagem que então enviou ao Congresso dos Estados Unidos, o  presidente declarou o direito de os Estados Unidos policiarem o mundo, ao mesmo tempo em que instruiu seus emissários à América Latina a se valerem do provérbio africano que recomenda falar macio, mas carregar um porrete grande.
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Se a idéia desse ato público foi de Washington, deveríamos ter ponderado, com toda a elegância diplomática, a sua inconveniência. Se a sugestão partiu do Itamaraty ou do Planalto, devemos lamentar a imprudência. Com todos os seus méritos, a presidência Obama ainda não conseguiu amenizar o sentimento de animosidade de grande parte do povo brasileiro com relação aos Estados Unidos. Afinal, nossa memória guarda fatos como os golpes de 64, no Brasil, de 1973, no Chile, e ação ianque em El Salvador, em 1981, e as cenas de Guantánamo e Abu Ghraid.
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O Rio de Janeiro é uma cidade singular, que, desde a noite das garrafadas, em 13 de março de 1831, costuma desatar seu inconformismo em protestos fortes. A Cinelândia, como outros já apontaram, é o local em que as tropas revolucionárias de 1930, chefiadas por Getúlio Vargas, amarraram seus cavalos no obelisco então ali existente. Depois do fim do Estado Novo, foi o lugar preferido das forças políticas nacionalistas e de esquerda, para os grandes comícios. A Cinelândia assistiu, da mesma forma, aos protestos históricos do povo carioca, quando do assassinato do estudante Edson Luis, ocorrido também em março (1968). Da Cinelândia partiu a passeata dos cem mil, no grande ato contra a ditadura militar, em 26 de junho do mesmo ano.
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Não é, convenhamos,  lugar politicamente adequado para o pronunciamento público do presidente dos Estados Unidos. É ingenuidade não esperar manifestações de descontentamento contra a visita de Obama. Além disso – e é o mais grave – será difícil impedir que agentes provocadores, destacados pela extrema-direita dos Estados Unidos, atuem, a fim de criar perigosos incidentes durante o ato. Outra questão importante: a segurança mais próxima do presidente Obama será exercida por agentes norte-americanos, como é natural nessas visitas. Se houver qualquer incidente entre um guarda-costas de Obama e um cidadão brasileiro, as conseqüências serão inimagináveis.
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Argumenta-se que não só Obama, como Kennedy, discursaram em público em Berlim. A situação é diferente. A Alemanha tem a sua soberania limitada pela derrota de 1945, e ainda hoje se encontra sob ocupação militar americana.
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Finalmente, podemos perguntar se a presidente Dilma, ao visitar os Estados Unidos, poderá falar  diretamente aos novaiorquinos, em palanque armado no Times Square.













13 de mar. de 2011

Como os chamados guardiões da liberdade de expressão estão a silenciar o mensageiro

por John Pilger 

Quando os Estados Unidos e a Grã-Bretanha procuram uma desculpa para invadir mais um país árabe rico em petróleo, a hipocrisia torna-se habitual. O coronel Kadafi é "enganoso" e "banhado em sangue" ao passo que os autores de uma invasão que matou um milhão de iraquianos, que sequestra e tortura em nosso nome, são inteiramente sãos, nunca se banharam em sangue e foram sempre os árbitros da "estabilidade".


Mas algo mudou. A realidade já não é mais aquilo que os poderosos dizem que ela é. De todas as revoltas espectaculares em todo o mundo, a mais estimulante é a insurreição do conhecimento ateada pelo WikiLeaks. Não se trata de uma ideia nova. Em 1792, o revolucionário Tom Paine advertiu seus leitores na Inglaterra que o seu governo considerava que "o povo deve ser ludibriado e mantido na ignorância supersticiosa por um bicho papão ou outro". A obra "Os direitos do homem" ("The Rights of Man") de Paine foi considerada tamanha ameaça para a elite controladora que foi ordenado a um grande júri secreto para acusá-lo de "conspiração perigosa e traiçoeira". Sensatamente, ele procurou refúgio em França.

O suplício e a coragem de Tom Paine são mencionados pela Sydney Peace Foundation ao conceder o prémio de direitos humanos da Austrália, a Medalha de Ouro, a Julian Assange . Tal como Paine, Assange é uma pessoa independente que não está ao serviço de qualquer sistema e é ameaçada por um grande júri secreto, uma dispositivo malicioso abandonado há muito na Inglaterra mas não nos Estados Unidos. Se for extraditado para os EUA, é provável que desapareça no mundo kafkiano que produziu o pesadelo da Baía de Guantanamo e agora acusa Bradley Manning, alegado informante do WikiLeaks, de um crime capital.

Se fracassar o presente recurso de Assange contra a sua extradição da Grã-Bretanha para a Suécia, uma vez acusado provavelmente negar-lhe-ão fiança e será mantido incomunicável até o seu julgamento secreto. O caso contra ele já foi retirado de um promotor sénior em Estocolmo e só foi ressuscitado quando um político de extrema-direita, Claes Borgstrom, interveio e fez declarações públicas acerca da "culpa" de Assange. Borgstrom, um advogado, agora representa as duas mulheres envolvidas. Seu sócio é Thomas Bodstrom, o qual, como ministro da Justiça da Suécia em 2001, esteve implicado na entrega de dois refugiados egípcios inocentes a um esquadrão de sequestro da CIA no aeroporto de Estocolmo. A Suécia posteriormente indemnizou-os pelas suas torturas.

Estes factos foram documentados em 2 de Março numa reunião do parlamento australiano, em Canberra. Perspectivando o enorme abuso legal que ameaça Assange, o inquérito ouviu evidências de um perito de que, sob padrões internacionais de justiça, o comportamento de certos responsáveis na Suécia seria considerado "altamente impróprio e repreensível [e] impeditivo de um julgamento justo". Um antigo diplomata sénior australiano, Tony Kevin, descreveu os laços estreitos entre o primeiro-ministro sueco Frederic Reinheldt e a direita republicana nos EUA. "Reinfeldt e [George W.] Bush são amigos", disse ele. Reinhaldt atacou Assange publicamente e contratou Karl Rove, o antigo parceiro de Bush, para aconselhá-lo. As implicações da extradição de Assange da Suécia para os EUA são terríveis.

O inquérito australiano foi ignorado no Reino Unido, onde actualmente se prefere a farsa negra. Em 3 de Março, o Guardian anunciou que a Dream Works de Stephen Spielberg estava para produzir "um filme de investigação nos moldes de "All the President's Men" a partir do seu livro "WikiLeaks: Inside Julian Assange's War on Secrecy". Perguntei a David Leigh quem escreveu o livro com Luke Harding, quanto Spielberg havia pago ao Guardian pelos direitos de filmagem e o que ele pessoalmente esperava fazer. "Não tenho ideia", foi a resposta enigmática do "editor de investigações" do Guardian. O Guardian nada pagou à WikiLeaks pelo seu valioso tesouro de fugas de informação. Assange e a WikiLeaks – e não Leigh ou Harding – são responsáveis pelo que o editor do Guardian, Alan Rusbridger, chama "um dos maiores furos jornalísticos dos últimos 30 anos".

O Guardian deixou claro que não pretende mais utilizar Assange. Considera que ele é um irresponsável que não se ajusta ao mundo Guardian, que se demonstrou um negociador duro e não adequado para membro do clube. E corajoso. No livro do Guardian sobre si próprio, a coragem extraordinária de Assange é eliminada. Ele ali torna-se uma pequena figura de estupefacção, um "australiano raro" com uma mãe de "cabelo frisado", é gratuitamente insultado como "insensível" e com uma "personalidade estragada" que estava "no espectro autístico". Como Spielberg tratará deste pueril assassinato de carácter?

No Panorama da BBC, Leigh permitiu-se propalar boatos acerca de Assange sem se preocupar com as vidas dos mencionados nas fugas. Quanto à afirmação de que Assange se havia queixado de uma "conspiração judia", ao que se seguiu uma enxurrada de asneiras na Internet como sendo um nocivo agente da Mossad, Assange rejeitou tudo como "completamente falso, no espírito e na letra".

É difícil descrever, quem dirá imaginar, a sensação de isolamento e de cerco de Julian Assange, o qual de um modo ou de outro está a pagar por arranhar a fachada da potência rapinante. O cancro aqui não é a extrema-direita mas o liberalismo fino como papel daqueles que guardam os limites da liberdade de palavra. O New York Times distinguiu-se fiando e censurando o material WikiLeaks. "Estamos a levar todos os telegramas à administração", disse Bill Keller, o editor. "Eles convenceram-nos de que editar alguma informação seria sensato". Num artigo de Keller, Assange é insultado pessoalmente. Em 3 de Fevereiro, na Columbia School of Journalism, Keller disse, com efeito, que não se podia confiar no público para a divulgação de novos telegramas. Isto pode provocar uma "cacofonia". Falou o guarda do portão.

O heróico Bradley Manning é mantido nu sob luzes e câmaras 24 horas por dia. Greg Barns, director da Aliança Australiana de Advogados, afirma que os temores de que Julian Assange "acabará por ser torturado numa prisão de alta segurança americana" são justificados. Quem assumirá a responsabilidade por tal crime?




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O original encontra-se em www.johnpilger.com/...

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .






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12 de mar. de 2011

Balanço inicial do Governo Dilma

Diário Liberdade - [Raphael Tsavkko] A seguir, uma breve análise sobre diversos pontos críticos nestes primeiros meses do governo Dilma.

Política Externa

De início há o justificado temor de que tudo que foi conquistado por Celso Amorim seja destruído. E digo justificado pois desde o começo o novo chanceler, Antônio Patriota, dá mostras de ter um estilo totalmente diferente da de seu antecessor.

As previsões de continuísmo, ao menos no plano internacional, do governo de Dilma Rousseff foram abaladas com as declarações recentes da presidente eleita e de seu chanceler, Antonio Patriota. Em entrevista ao jornal “Washington Post”, Dilma discordou da abstenção brasileira na votação da Assembleia Geral das Nações Unidas que apontou violações de direitos humanos pelo Irã. Não é novidade que Dilma pleiteia um governo que possua feição própria, assim discursando seu mentor eleitoral Lula, e que naturalmente seu mandato será um governo diferente. O questionamento tão imediato, porém, põe em cheque a posição controvertida construída por anos pelo governo brasileiro em relação a países violadores de direitos humanos.

Uma novidade trazida pela Dilma - que vai de encontro com a forma pela qual agiu o Itamaraty durante Lula - é o de pautar sua política externa nos "Direitos Humanos". Parece um tema que merece apoio óbvio, porém a questão é mais profunda.

Amorim, em sua política externa progressista, buscou balancear soberania nacional e direitos humanos, e tinha como diretriz imposta ao Itamaraty a tese de não condenar países violadores de Direitos humanos até que todos os canais e meios estivessem saturados, ou seja, o Brasil não ia apoiar sanções e condenações na ONU até que houvesse uma efetiva e exaustiva negociação com o país supostamente a violar os direitos humanos ou a desrespeitar o direito internacional.

Foi isto que levou o Brasil a chegar a um acordo satisfatório com o Irã e a Turquia, enquanto EUA e aliados se limitavam a condená-lo sem terem sequer sentado e conversado sem armas apontadas.

Agora, porém, Dilma resolveu adotar posição de militante dos DH, o que a coloca alinhada com os EUA. Alinhada pois casos sérios de abuso dos direitos humanos que chegam à ONU costumam se limitar aos do terceiro mundo, enquanto potências aliadas ou mais ou menos amigas dos EUA – vide China – jamais são constrangidas a tal ponto.

Isto significa basicamente um maior alinhamento com os EUA e um afastamento considerável do terceiro mundo, algo que foi a bandeira do governo Lula e um marco na nossa política externa.

A mesma análise foi feita pelo Azenha no Vi o Mundo, ainda que eu discorde de sua tese de que esta aproximação com os EUA signifique que o Brasil procura chegar ao Conselho de Segurança através das mãos americanas.

Os EUA já tem um candidato de peso, a Índia e, além disso, dificilmente considerariam como positiva a ideia de ter no Conselho um país que faz parte de seu quintal. Seria impensável que um país que tem a obrigação de ser subserviente como um parceiro em pé de igualdade aos EUA, com direito ao mesmo veto, especialmente um país com nosso tamanho e que às vezes tem aspirações que não casam com as dos EUA.

De fato, seria ingenuidade achar que o Brasil conseguiria chegar no Conselho pelas mãos dos EUA. A não ser que a política estadunidense tenha dado uma guinada absurda de uma hora para outra. A Índia serve perfeitamente aos propósitos dos EUA porque precisa mendigar pelo apoio da potência na sua briga com o Paquistão e por toda ajuda econômica que recebe. Além de ser uma forma de irritar a China, potência regional que nunca se deu bem com a Índia.

As hipóteses aventadas pelo Azenha vão das factíveis até algumas que dificilmente poderiam ser críveis:

Testando hipóteses: o Brasil adota o receituário de Washington para os Direitos Humanos (vale cobrar Cuba, Venezuela, Sudão, Irã, Zimbábue, Coreia do Norte; não vale cobrar Estados Unidos, Arábia Saudita, Israel, etc); o Brasil desiste de uma política externa independente e de futuras pretensões nucleares (como fez a França, ao optar por ter seu próprio guarda-chuva nuclear, independente da OTAN); o Brasil compra caças americanos F-18 e ganha o papel de gendarme disfarçado dos Estados Unidos na América Latina (ampliando o papel que já desempenha no Haiti, por exemplo); o Brasil ganha um assento no Conselho de Segurança. 

O Brasil pode efetivamente se aproximar dos EUA, mas seria difícil, por exemplo, o próprio PT aceitar críticas explícitas à Cuba ou Venezuela, sem falar no prejuízo que isto traria para o Brasil regionalmente (quando a maior parta da AL está alinhada com o pensamento bolivariano em maior ou menor grau). Outra coisa pouco factível é o Brasil desistir de seu programa nuclear pacífico (o que, aliás, aproxima o Brasil do Irã) que, dizem, tem uma tecnologia que mesmo os EUA querem se apoderar.

O fato é que qualquer aproximação com os EUA depois de 8 anos de uma política externa fantástica e independente de Celso Amorim seria um retrocesso vergonhoso. Amorim e Lula passaram 8 anos cortejando o terceiro mundo por apoio para chegar ao Conselho de segurança - e também atrás de vantagens econômicas, acordos preferenciais - e Dilma e Patriota podem colocar tudo isto a perder.

A mudança que já se pode notar do estilo de Patriota frente ao de Celso Amorim foi a frouxa nota que o Itamaraty lançou em meio à crise no Egito. Pra dizer o mínimo, foi vergonhosa. Além de atrasada e de demonstrar que os temores de alinhamento com os EUA podem ser justificados.

Como todos já sabem, os EUA durante os primeiros dias de protesto buscou livrar Mubarak da pressão, apenas pedindo mudanças no regime, até enxergar que a população não se contentaria. O Brasil foi no mesmo caminho, se limitando a repudiar brevemente a violência sem, porém, sem grandes comentários sobre o regime em si e com críticas apenas tímidas.

Se colocar junto aos movimentos sociais foi pauta da política externa brasileira anterior, assim como se opor aos interesses dos EUA.

O Governo brasileiro deplora os confrontos violentos associados aos últimos desdobramentos da crise no Egito, em particular os atos de hostilidade à imprensa reportados ontem e hoje.

O Governo brasileiro protesta contra a detenção dos jornalistas brasileiros Corban Costa, da Rádio Nacional, e Gilvan Rocha, da TV Brasil, e manifesta a expectativa de que as autoridades egípcias tomem medidas para garantir as liberdades civis e a integridade física da população e dos estrangeiros presentes no país.

Ao reafirmar a solidariedade e amizade do Brasil ao povo egípcio, o Governo brasileiro espera que este momento de instabilidade seja superado com a maior rapidez possível em um contexto de aprimoramento institucional e democrático do Egito.

A Embaixada do Brasil no Cairo continuará prestando assistência a turistas e residentes brasileiros que se encontram no país. 

Mesmo na mais primorosa linguagem diplomática, conhecida pelos panos quentes ou mesmo pela luva de pelica, a mensagem do Brasil é simplesmente ridícula. Fraca, tímida, ineficiente e muito aquém da posição anterior da chancelaria.

A lerdeza e ineficiência da Chancelaria brasileira são dignas de nota. Posso destacar dois momentos.

Primeiro, a lerdeza na condenação dos governos do Egito e Líbia, ou melhor, na leve censura, o que nos leva ao principal problema, o da falta de uma condenação contundente, mas apenas do afago aos regimes de então (o de Mubarak, caído, e o de Kadhafi, prestes a cair) e o pedido para a resolução pacífica do conflito. E mais nada.

A nota na crise do Egito:

Ao tomar conhecimento dos recentes acontecimentos no Egito, o Brasil manifesta sua expectativa de que a transição política naquele país transcorra dentro do respeito às liberdades políticas e civis e aos direitos humanos da população, em ambiente de paz e tranquilidade.

O Brasil acompanha com grande interesse a evolução da situação política no país amigo, que, além de parceiro relevante, desempenha papel importante para a estabilidade do Oriente Médio.

Ao solidarizar-se com a população egípcia na busca da realização de suas aspirações, o Brasil reafirma sua confiança de que as lideranças políticas da sociedade egípcia saberão fazer face a este momento

E a nota da crise na Líbia, ainda mais pífia:

Ao tomar conhecimento da deterioração da situação na Líbia, o Governo brasileiro conclama as partes envolvidas a buscarem solução para a crise por meio do diálogo, e reitera o repúdio ao uso da violência.

O Governo brasileiro insta as autoridades líbias a tomarem medidas no sentido de preservar a segurança e a livre circulação dos estrangeiros que se encontram no país. O Governo brasileiro tem a expectativa de que as autoridades líbias deem atenção urgente à necessidade de garantir a segurança na retirada dos cidadãos brasileiros que se encontram nas cidades de Trípoli e Bengazi.

O Brasil com Celso Amorim buscou firmar sua presença no Oriente Médio (com o excelente e memorável acordo Brasil-Irã-Turquia), e chegou até a ensaiar papel como mediador no conflito Israel-Palestino. A frouxidão das mensagens da Chancelaria agora contrastam fortemente com as atitudes do governo passado.

De atuante e influente, interessado em realmente resolver as questões e negociar saídas para um país irrelevante, tímido, hesitante e sem qualquer interesse em influenciar a região. Enquanto acontece a crise na Líbia Patriota desfila ao lado de Hillary Clinton e prepara a visita de Obama ao Brasil, não podia ser um sinal mais significativo da subserviência frente aos EUA que se desenha.

Os 8 anos de diplomacia atuante do Brasil parecem ter dado lugar aos 8 de política externa vergonhosa de FHC e Celso Lafer, mas ainda sem o Chanceler tirar o sapato.

Cabe a leitura do artigo que escrevi para o Correio da Cidadania sobre as diferenças entre a política externa de Lula (Amorim) e de Dilma (Patriota).
MinC

Curioso, na Cultura, é ver o que falavam em Fevereiro e o que se comprovou em março, pese negativas do ministério. A mentira sempre acaba descoberta.
Em fevereiro havia a possibilidade de Hildebrando Pontes, advogado pró-Direitos Autorais e ferrenho opositor de qualquer reforma da LDA ser indicado para um cargo no MinC:

Finalmente, entrando na Cultura, temos a possibilidade assustadora de Hildebrando Pontes ser nomeado para cargo no MinC. Para quem não o conhece, vale - para quem tem estômago - conhecer suas posições francamente anticompartilhamento e pró-direitos autorais no link. Figura conhecida dos ativistas pela liberdade, Pontes é ferrenho defensor das grandes empresas de mídia e seria a definitiva guinada do MinC, que vem fazendo burrices atrás de burrices.

Creio que todos aqueles que têm apreço pela criação artística estão na hora de compreender que, quanto mais avança a tecnologia, mais distante do controle de suas obras ficam os autores. Portanto, o fenômeno da digitalização, a impulsionar a proliferação constante de novas tecnologias, impõe, irremediavelmente, novos desafios, a dificultar enormemente a compreensão e o exercício da proteção autoral.

O MinC negou teria feito o convite, mas a ministra Ana de Hollanda se reuniu com ele e, segundo fontes, foi a pressão da militância que fez a ministra recuar.

Em março, porém, vimos que havia não só fumaça, mas fogo na história. Hildebrando acabou não nomeado, mas indicando uma advogada do mesmo grupo pró-Direitos Autorais que o seu.

Não bastou à Ministra usar capangas para atacar opositores, como o Dep. Paulo Teixeira, sua intenção clara é a de destruir absolutamente tudo que foi conquistado por Gil e Juca enquanto Ministros.

Os Pontos de Cultura estão ameaçados, o Creative Commons e a tese do compartilhamento e da Cultura Digital foram violentados e, agora, a Reforma da LDA foi jogada no lixo. Isso sem contar com os afagos ao ECAD.

- Após dois meses de especulação, a ministra da Cultura, Ana de Hollanda, deu o principal sinal de que vai abandonar a reforma da Lei de Direito Autoral, um dos principais pontos defendidos pela política cultural do governo Lula. Ana afastou Marcos Souza da gestão da Diretoria de Direitos Intelectuais (DDI) do Ministério da Cultura (MinC), órgão responsável por coordenar a reforma, e convidou Marcia Regina Barbosa, servidora da Advocacia-Geral da União, para o cargo. Souza era o principal defensor dentro do governo da necessidade de se continuar o processo da reforma da lei, cujos debates são promovidos pelo governo desde 2007.

O nome de Marcia teria sido indicado para o MinC por Hildebrando Pontes Neto, ex-presidente do Conselho Nacional de Direito Autoral (CNDA), órgão que regulou o setor entre 1973 e 1990, até ser extinto. Após deixar o governo, ele vem advogando em mais de cem processos para o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição, o Ecad, uma instituição que conglomera associações de compositores e músicos e que sempre foi contrária à reforma. Entre as dezenas de pontos que o Ecad critica, o principal é a criação de uma instância que regulamentaria as ações do escritório, hoje com autonomia para recolher e distribuir direitos autorais. 

Em janeiro, era dada como certa dentro do MinC a nomeação de Hildebrando para a DDI. Ana de Hollanda chegou a se encontrar com o advogado do Ecad no dia 27 de janeiro, numa reunião oficial em Brasília, gerando especulações em redes sociais e reações de grupos a favor da reforma da lei. Mas o MinC negou que Hildebrando fosse assumir o cargo.

Como se vê, a ministra joga sujo. Não nomeou o Hildebrando, mas alguém indicada por ele, o que, no fim, dá no mesmo. Este é mais um significativo retrocesso que Dilma nos dá de presente e finge não ver o que acontece.

A saída de Marcos Souza causou um racha no MinC:

Um racha atingiu ontem a Diretoria de Direitos Intelectuais do Ministério da Cultura em Brasília. A internet foi tomada com diversas manifestações de protesto pela exoneração do diretor da área, Marcos Alves de Souza. O imbróglio deve se radicalizar: 16 pessoas ameaçam afastar-se daquele setor do ministério nos próximos dias, segundo informações obtidas pelo Estado.

E esse racha é pequeno em comparação ao que Dilma e MinC terão de aguentar: A revolta dos ciberativistas.

Muitos votaram em Dilma crentes da continuidade, mas o que receberam foi uma imensa traição, o desmonte de tudo pelo que lutaram.

Caso mais recente é o da demissão de Emir Sader da CaSa de Rui Barbosa, sem nem mesmo ter assumido o cargo. Crítico dos rumos do MinC, Sader teria declarado em entrevista à Folha que a ministra Ana de Holanda seria "meio autista"e, por isto, demitido através de nota curta e grossa. Ouça o áudio.

Não entrarei no mérito do termo usado por Sader (a @nideoliveira71, no Twitter, deu o recado), mas só posso repudiar a decisão da ministra. Sader fez diversas críticas pertinentes à "gestão" da Rainha de Hollanda no Ministério e sua franqueza foi duramente punida.

O MinC está rachado, tomado por amantes dos Direitos Autorais e capangas da Ministra, e agora mais uma crise se abre.

Sim, a declaração de Sader foi infeliz, ele ainda piorou as coisas ao, no Twitter, dizer absurdos contra jornalistas que trabalham na grande mídia (como se tivessem alternativa) e etc, mas mesmo assim, a posição da Ministra é lamentável.

É óbvio que em uma relação trabalhista, se um subordinado chama o chefe de "autista", ou o xingá-lo de qualquer outra forma, a demissão será certa. A questão, porém, é outra. Se trata da insatisfação de importantes setores tanto da sociedade quanto dentro do próprio MinC que se recusam em aceitar os enormes retrocessos que estamos vendo. Sader foi o transbordamento público e com mais notoriedade.

Os Pontos de Cultura foram abandonados e o MinC lhes deve 60 milhões, o ECAD está mais fortalecido que nunca, a Reforma da LDA será enterrada e foi entregue a uma ferrenha defensora do modelo atual de Direitos Autorais... Tudo parece dar errado no MinC.

A questão central em todo este imbróglio está no terrível retrocesso em praticamente TODAS as áreas geridas pelo MinC e Ana de Hollanda. Tudo que veio sendo construído nos últimos oito anos está sendo abandonado, mudado, eliminado e Dilma aparentemente não nota o que acontece, nem que uma parte significativa da militância já está a ponto de romper seriamente senão com o governo, mas com alguns setores-chave.

E a insatisfação de muitos não se limita ao MinC, mas vai muito além e acredito na possibilidade de rachas sérios nos próximos meses enquanto Dilma finge não ver o que acontece. Se ela não tomar nenhuma atitude estará referendando todas estas mudanças de rumo, o que é preocupante, para dizer o mínimo.

Cargos

Na questão dos cargos, honestamente, penso que qualquer cargo entregue ao PMDB seja temerário mas, sendo realista, posso criticar dois em particular que são intoleráveis.

O primeiro, sem dúvida, é Garibaldi Alves. Como podemos aceitar dar a chave do cofre, a Previdência, a um bandido? Se hoje falam em rombo da previdência (o que é uma farsa), imaginem depois que esta figura colocar suas mãos no nosso dinheiro e começar a irrigar o bolso de seus comparsas?

Outra grave nomeação é a de Moreira Franco, outro canalha, para a Secretaria de Assuntos Estratégicos no lugar de Samuel Pinheiro Guimarães, que dispensa apresentações. O governo do Brasil, desta forma, comprova e aceita a tese de que realmente não pensa a longo prazo. Matou uma secretaria importante (ou que poderia/deveria) ser importante colocando um zero a esquerda apenas para lhe garantir um salário.

Assusta ainda a possibilidade que os neo governistas como Kassab e Kátia Abreu possam, futuramente, ter vaga garantida em ministérios (ou mesmo se tornarem ministros) caso seja esta exigência para entrarem no governo.

Meio Ambiente (Belo Monte)

Impossível falar de meio ambiente sem falar do maior crime ambiental que um país pode promover: Belo Monte.

A liberação das obras de Belo Monte, assinada nessa quarta, 26, pelo Ibama, é o primeiro grande crime de responsabilidade do governo federal neste ano que nem bem começou.

Foi dado sinal verde para que um enorme predador se instale às margens do Xingu para devorar a mata, matar o rio e destruir nossas casas, plantações e vidas, atraindo centenas de milhares de iludidos, que este mesmo governo não consegue tirar da miséria. Em busca de trabalho, que poucos encontrarão, eles chegarão a uma região sem saneamento, saúde, segurança e escolas.

Denunciamos esta obra, que quer se esparramar sobre nossas propriedades, terras indígenas e a recém reconhecida área de índios isolados, como um projeto genocida. Denunciamos essa obra como um projeto de aceleração da miséria, do desmatamento, de doenças e da violação desmedida das leis que deveriam nos proteger. Denunciamos que toda essa miséria, violência e destruição será financiada com dinheiro público dos contribuintes, através do BNDES

Sem nenhum respeito pelos movimentos sociais e pela população local, o governo dá sinais de que não freará a construção deste monstro ou de que levará opinião alguma em conta, senão a sua própria dentro deste sonho neodesenvolvimentista datado.

Leonardo Sakamoto é direto:

Belo Monte será um grande gerador de impactos sociais e ambientais. Por exemplo, o Ministério Público Federal avalia em cerca de 40 mil o total de atingidos – incluindo populações tradicionais e indígenas.

Como já disse aqui em um post dias atrás, não adianta o governo federal elevar a questão dos direitos humanos nas relações internacionais e não executar o mesmo internamente. Se quiser fazer valer os direitos humanos em regiões rurais, a presidenta Dilma Rousseff terá que comprar brigas com áreas que lhe são importantes, como o setor elétrico. Coisa que, acredito, não vá fazer, muito pelo contrário. Incluída no PAC e no Plano Decenal de Energia (2007-2016), Belo Monte está planejada para ter uma potência máxima de 11,1 mil MW, mas a produção média estimada pela Eletrobrás é de 4.796 MW.
Lutou-se na ditadura não apenas por liberdade civis e políticas, mas por direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais. Desse ponto de vista, como justificar diferenças entre o discurso de uma época em que abríamos grandes estradas em rito sumário para o momento em que construímos gigantescas hidrelétricas em rito sumário, xingando os opositores de “arautos do atraso”?

O perigo que traz Belo Monte é descartado pelo governo sem qualquer tipo de discussão. Um verdadeiro crime contra a natureza e a humanidade está em curso.

Por trás desse discurso oficial de “normalidade” criado pelo governo, pessoas organizadas em movimentos sociais e ambientais vêm construindo, desde a década de 1970, sua própria história de resistência à construção de Belo Monte. São elas índios e ribeirinhos, cujos modos de vida e meios de sobrevivência atuais sofrerão um impacto desastroso com a construção da usina.

Economia

O governo Dilma mal chegou e, como primeira medida na economia, aumentou de cara os juros. Tudo isto como pano de fundo para cortes de gastos - medidas que fazem os privatistas e os papas do FMI darem pulinhos de alegria.

Depois de elevar a taxa básica de juro da economia (a Selic) em 0,5 ponto percentual, o Banco Central (BC) passou a ser bombardeado por críticas de dirigentes sindicais, de políticos ligados ao PT e de integrantes da chamada “ala desenvolvimentista” do governo. O bombardeio ainda não atingiu a intensidade observada em passado recente, mas já há sinais de uma luta surda nos bastidores em torno da condução da política econômica. A retomada desse embate talvez resulte do primeiro erro cometido pelo governo Dilma, ao adiar o anúncio do corte de gastos para a obtenção do superávit primário deste ano.

Obras do PAC podem ser atingidas pelos cortes (por mais que ministros tentem negar) e diversos setores podem sofrer dos cortes. Um governo que basicamente se sustentou - e fugiu da crise - através de medidas artificiais de promoção do consumo não pdoe se dar ao luxo de, de um dia pro outro, defender cortes.

De fato, haverá cortes no orçamento das universidades federais (isto porque Dilma iria privilegiar o ensino em seu governo) e o turismo pode ter cortes de 84% e o Minha Casa Minha Vida também terá cortes.

Dilma MENTIU ao afirmar várias vezes que não cortaria verbas do PAC. Cortou 40% do Minha Casa Minha Vida, ou seja, PAC. além disso o orçamento pro Esporte e Turismo, às vésperas de Copa do Mundo, Olimpíada e mais outros eventos esportivos só pode ser piada de mal gosto.

Mas não para por aí, como mostra Altamiro Borges:

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central aprovou, nesta quarta-feira (2), mais um aumento de 0,5% na taxa básica de juros. A mídia corporativa, que mantém sólidos vínculos com o capital financeiro, já havia cantado a bola de que isto iria ocorrer. Na verdade, ele utilizou as duas últimas semanas para criar o clima neste sentido – com manchetes sobre o fantasma da inflação e queixas contra as medidas “tímidas” de cortes do Orçamento da União (e olha que foram R$ 50 bilhões de cortes!).

O Brasil não só volto a ter a maior taxa de juros do mundo, como ainda transferiu 15 bi em títulos da dívida para credores. Cortamos 50 bi do orçamento, mas pagamos até agora quase 200 bi em dívida só contanto 2010 e 2011.

O governo Dilma conseguiu numa pancada só ser chamada de populista pela mídia ao elevar o Bolsa Família, ser xingada pelas centrais por não ter elevado o mínimo o quanto deveria e acabou recebendo elogios apenas dos grandes investidores, dos tubarões financeiro, que continuarão a ter lucros monstros.
Desta forma, o Brasil retrai a economia, segura investimentos, faz cortes em setores já deficitários e desagrada o conjunto da população, quem elegeu Dilma pra CONTINUAR o governo Lula e não para virar um FHC parte 2 e promover uma política econômica neoliberal que acreditávamos ter nos livrado. Ou deveríamos.

Defesa 

Entulho do governo Lula, Nelson Jobim foi mantido no Ministério da Defesa, apesar de todo seu extenso e incansável trabalho como espião dos EUA e na vanguarda do atraso, aliado com a extrema-direita militar para matar o PNDH3 e inviabilizar a criação da Comissão da Verdade, para impedir a abertura dos documentos da Ditadura e evitar que as famílias dos mortos e desaparecidos possam enterrar seus entes queridos.

Jobim é do PMDB e, acreditem, não está no governo porque assim quis o PMDB, mas está lá na cota PESSOAL de Dilma. Isto mesmo, Jobim é ministro porque Dilma quer.

Isto demonstra de forma incontestável o desrespeito do governo com as vítimas da Ditadura e a falta de compromisso com a abertura dos documentos. E ainda mais, que o Brasil não tem problemas em ter um espião dos EUA no governo. Isto nos faz pensar... E tem franca relação com a guinada atual da nossa política externa.

Aliás, nem vou tocar no caso dos caças para a Força Aérea, pois já estão virando lenda.

Ditadura e Direitos Humanos

Ao contrário do que eu imaginava inicialmente, Maria do rosário não cedeu frente aquilo que Vanucchi defendia. Se não faz mais é porque não está em suas mãos fazê-lo como abrir os arquivo ou impor a implantação efetiva do PNDH3. Mas ela tenta.

Mas por parte de Dilma, nenhum palavra sobre a abertura dos arquivos ou sobre o PNDH3. Logo no início de seu governo, Dima visitou as Mães e Avós da Praça de Maio e estas lhe pediram para abrir os arquivos, algo que não está na agenda presidencial. Chega a ser ridículo o encontro com as Mães e Avós quando o tratamento no Brasil aos crimes da Ditadura é o de passar a mão na cabeça dos criminosos e não fazer nada pelas vítimas.

O Brasil foi recentemente condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, que repudiou a Lei da Anistia:

O que espanta, porém, é que o novo governo federal, presidido por uma vítima da repressão criminosa comandada pela gente fardada no poder, resolveu proceder como se nada tivesse a ver com isso. "Fomos mesmo condenados? Bem, ainda não tivemos tempo de nos ocupar do caso".

Nenhuma palavra de Dilma, nenhuma palavra da mídia e nem dos ministérios pertinentes.

Nada vem sendo feito para resgatar nossa memória, na verdade vem sendo feito o contrário, através da negação da memória, da negação do direito das vítimas de saberem a verdade e serem reparadas e da negativa do governo em sequer reconhecer a decisão da Corte Interamericana.

Em muitos casos mesmo o acesso à documentos públicos sobre os anos de chumbo vem sendo dificultado ou mesmo negado pelas autoridades.

Especificamente na agenda dos direitos humanos, mas também relacionado com a Ditadura, está a persistente prática da tortura em cadeias, a superlotação de presídios, a situação desesperadora das mesmas e, finalmente, a mentalidade assassina da Polícia Militar, que mantém vivos os mesmos métodos de tortura da Ditadura, usando inclusive as chamadas armas não-letais para este fim, sem que haja qualquer controle ou punição.

Justiça

Em primeiro lugar, se desenha um significativo retrocesso na política do governo na questão das drogas com a saída de Pedro Abramovay da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD) depois de ter sido desautorizado em sua declaração de que os pequenos traficantes deveriam ter penas alternativas e não serem enviados para presídios, como grandes traficantes, apenas se reciclarem e piorarem.

Política de penalizar o pequeno tráfico e mesmo o consumo são características da pior direita e não de governos de esquerda ou progressistas, como concorda Carlos Magalhães:

A demonização das drogas, como se elas tivessem poderes malignos, quase uma intenção diabólica, de prejudicar as pessoas é a pior forma de encarar o problema. Drogas são substâncias químicas que interagem com a química cerebral. O que as drogas “fazem” depende de um contexto que é biológico, psíquico e social. Elas não têm poderes “mágicos”, bons ou ruins.
Nesse contexto, a criminalização só atrapalha (criminalização anda de mãos dadas com demonização, com construção de inimigos). Se o abuso de drogas é um problema, a criminalização é o agravante. Não é solução. Décadas de proibição e guerra às drogas só fizeram com que os problemas se tornassem cada vez maiores. Pessoas tiveram as suas vidas destruídas, não pela droga, mas pela prisão e pelo estigma. Os mais pobres são os que mais sofrem, pois são eles os “traficantes” (mesmo quando apenas usuários) que vão para a cadeia.

Outro caso de grande importância é o caso Battisti em que Dilma não só se humilhou como humilhou todo o país ao enviar uma carta ao presidente italiano justificando as ações do país e lavando as mãos, deixando com Peluso e Gilmar Mendes a vida de Battisti.

Não basta "deixar pra lá" o caso, mas também responder às reclamações do prostíbulo europeu (agradeçam Berlusconi).

Não concordo de todo com o tom, mas Laerte Braga vai na raiz do problema:
Ao afirmar que a decisão depende do STF – SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – a presidente está abrindo mão do seu direito constitucional de decidir ou não sobre a matéria, confirmado pelo próprio STF decisão anterior. A palavra final cabe ao presidente da República. E o ex-presidente Lula já a tomou.

Dilma Rousseff deve pegar a faixa e entregar a Cesar Peluso, ministro presidente do STF. Deve ir para casa. Mentiu e ludibriou milhões de brasileiros e ao próprio Lula que a fez candidata e presidente (faria um poste, logo Dilma e um zero à esquerda é a mesma coisa). Battisti refugiado, direito assegurado por Lula, é uma decisão correta, humana, faz jus ao Brasil e aos brasileiros. Se Berlusconi não gosta, paciência. Faça uma festa num dos seus palácios e convide os ministros Peluso e Gilmar Mendes.

E ele completa, em outra mensagem:

O fato da presidente da República pertencer a um partido supostamente comprometido com lutas populares e ter sucedido a um governo – Lula – que malgrado as críticas possíveis e passíveis, superou obstáculos e dificuldades os mais variados, bombas de efeito retardado deixadas pelo governo FHC, é preciso enxergar além de um outro fato, ver o todo, o conjunto.

A carta de Dilma foi resultado de uma discussão ampla sobre o assunto – a extradição de Cesare Battisti – e foi sim um ato de submissão, qualquer que tenha a expressão usada ou o “STF DECIDIR”, ou o “STF MANIFESTAR-SE”.

A corte dita suprema já se manifestou em julgamento anterior e como bem alertou o ministro Marco Aurélio Mello, a competência é do presidente da República. A de extraditar ou não. Dilma Rousseff teve conhecimento da decisão do então presidente Lula e apoiou-a. Mesmo porque fez parte do seu governo até a desincompatibilização para candidatar-se à presidente.

O assunto Battisti virou preocupação dentro do governo federal, o atual, seja pela reação do governo italiano, da carta do presidente da Itália ou pela descabida e lamentável atitude do presidente do STF o ministro Cesar Peluso. Ato contínuo ao decreto de Lula deveria ter sido expedido o alvará de soltura, ou mandado de soltura de Battisti e o ministro iria fazê-lo, cientificou o ex-presidente disso, até que contatado por Gilmar Mendes e o embaixador italiano resolveu participar, dar a partida nessa farsa de tentar um confronto com o Executivo.

Enfim, Dilma não só se humilhou – e ao país – a sequer se dignar a dar uma resposta aos mafiosos italianos, como ainda lavou as mãos no caso Battisti, repassando seu destino para o STF – antro de pilantras – e judicializando uma questão que o próprio Lula já havia decidido. A atitude da presidente não foi só covarde, como indigna e desrespeitosa. No momento em que ela fala tanto em defender os Direitos Humanos e ter este norte na política externa nacional, deveria começar a aplicar esta mesma diretriz ao país.

Caso que envolve tanto a Defesa quanto a Justiça, algo que tomei conhecimento através da Carta Capital, foi o acordo que vem sendo costurado entre Cardozo e Jobim de revisar e revogar os benefícios dados a 2,5 mil cabos da Aeronáutica que foram expulsos das Forças Armadas em outubro de 1964 por supostamente serem elementos nocivos à ordem, ou seja, eram de esquerda. Todos os expulsos faziam parte da Associação de Cabos da Força Aérea Brasileira (Acafab) e o ditador Castelo Branco, através da portaria 1.103 os expulsou da Aeronáutica.

Trata-se de retirar os direitos de quem foi duramente prejudicado pelo Golpe, enquanto os criminosos que torturaram e mataram seguiram com suas carreiras e nunca foram incomodados... até hoje. E no que depender de Dilma, nunca serão incomodados. Jobim e a justiça (sic) brasileira não se contentaram apenas em blindar os criminosos, como agora atacam as vítimas. Muito bom para um governo de Esquerda (sic).

Publicado originalmente no blog de Raphael Tsavkko, The Angry Brazilian

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