Por Gilberto C. Marotta em 8/4/2008
Ainda é cedo para dizer se o (mal) chamado "escândalo do dossiê" irá ferir mais a ministra Dilma Rousseff e o governo Lula ou o senador Álvaro Dias e a oposição, mas de uma coisa tenho certeza: feriu, mais uma vez e gravemente, o jornalismo brasileiro. É impressionante a cobertura tendenciosa, a tentativa canhestra de transformar em escândalo o que é corriqueiro e, principalmente, de incentivar o clima de Fla x Flu político, sobretudo por Veja e Folha, o que infelizmente não constitui novidade alguma. Veja (ops!) as matérias, julgue por si mesmo. As manchetes, então, que maravilha! Ora se menciona "relatório" e "banco de dados", como diz o governo, ora e mais freqüentemente o "dossiê", como quer a oposição (a eleita e a midiática) e, muitas vezes, assim, não precedido de um cauteloso "suposto", como manda o jornalismo responsável, ou melhor, o jornalismo, simplesmente, uma vez que jornalismo verdadeiro prescinde de adjetivos.
Mas, aos fatos: houve um relatório, feito na Casa Civil. Nada extraordinário, uma vez que o governo já o admitiu. Intui-se que estava sendo feito um levantamento preventivo, tanto do ponto de vista administrativo (fossem os provocadores o TCU, elementos da própria oposição ou o diabo em pessoa) quanto do ponto de vista político, sabedor do uso sensacionalista que a oposição (imprensa, inclusive) vem tentando dar à questão dos cartões corporativos.
Pois bem. Sabemos que a oposição, para atingir Dilma e ao mesmo tempo blindar FHC, vazou, através do senador Álvaro Dias, parte desse relatório. Há que se saber, antes de qualquer coisa, se há crime no comportamento de um senador da República ao divulgar dados sigilosos ou documento público (integral ou fragmentado) sem pedir investigação ou denunciar o funcionário público autor do vazamento. No mínimo, há que se saber quais as relações de um senador da oposição com um suposto espião (prevaricador) no governo. Por nada disso a "grande imprensa" parece se interessar. Sabemos que jogo ela faz, a quem cumpre exclusiva e implacavelmente condenar ou defender.
Onde estão os "chantageados"?
Mas, bem pior que isso, o furo enorme, similar à cratera do metrô de São Paulo, é uma trupe de jornalistas (?), alguns bastante experientes, embarcar de mala e cuia na hipótese de "chantagem", quando não houve até agora um mísero cidadão que se dissesse chantageado e quando nem a imprensa, nem os parlamentares da oposição são capazes de apontar no relatório, ou em qualquer de seus fragmentos, elementos ilegais ou imorais que pudessem ser utilizados em uma chantagem. Se não há vítimas, nem elementos, onde se sustenta a acusação ao governo? Não obstante, as expressões estão lá, nas capas e nos miolos, nos horários nobres e em outros nem tanto, em grandes e pequenos caracteres: "dossiê", "chantagem"...
Produz-se, assim, mais uma peça de surrealismo tão afeita à nossa "grande imprensa" e aos dois principais partidos de oposição, o PSDB e o DEM/PFL. Todos conhecemos, aliás, a expertise dos tucanos com dossiês. Quem tem dúvida, consulte a íntegra do discurso do senador e ex-presidente José Sarney, proferido na tribuna em 20 de março de 2002, disponível no site do jornalista Luiz Carlos Azenha.
Da mesma forma, ninguém me tira da cabeça que foi forjado nos comitês tucanos o famoso dossiê que levou, em 2006, a eleição majoritária para o 2º turno. Não, não nego os aloprados. Eles existiram, meteram os pés pelas mãos e acabaram prejudicando enormemente o PT naquela ocasião. Mas foram enrolados, caíram como patinhos numa armadilha bem urdida pelos espsdbecialistas que conseguiram, de uma só tacada, prejudicar as candidaturas Lula, Mercadante e ainda – esse, o feito mais espetacular, que contou com evidente cumplicidade dos jornais – blindar Serra, banindo as fotos e vídeos de ambulâncias, comprometedores, definitivamente da mídia.
Aqui e lá, o DNA é o mesmo, vê-se pelo modus operandi: utiliza-se um suposto dossiê para carimbar no governo Lula e no PT a pecha de "chantagistas". Mas, perguntinha simples e necessária... Onde estão os chantageados e quais são as ilegalidades ou imoralidades que permitiriam a chantagem? Silêncio! O absurdo é tamanho que, mais do que nunca, cabe perguntar: que jornalismo é esse?
Pérolas a porcos
A ministra Dilma Rousseff, cuja competência, arrojo e seriedade costumam ser reconhecidos até por seus adversários mais ferrenhos, disse em alto e bom som: "Há tentativa de escandalizar o nada!" Como notou um leitor, num desses blogs da vida, haverá o momento – como houve o da "epidemia" de febre amarela, em que assistiremos ao efeito contrário, a "nadificação do escândalo", mais uma jogada de nossos showrnalistas (a expressão é do jornalista José Arbex Jr.), que pode ser resumidamente descrita do seguinte modo: no momento em que os fatos começarem a evidenciar que, das duas uma, ou as duas, o crime não foi do governo, mas sim da oposição; e que houve má-fé da imprensa no episódio, esse último "escândalo" desaparece instantaneamente das manchetes e capas sem deixar vestígios. As prioridades e artimanhas se voltarão, então, para o próximo escândalo que, seja ele qual for, terá que ser produzido.
Alguns jornalistas da blogosfera andaram fazendo levantamentos mais detalhados sobre as manifestações da imprensa no caso. Vale a pena dar uma olhada no que está publicado no blog do jornalista Luis Nassif, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, e aqui.. E por Paulo Henrique Amorim, aqui. E aqui, quentinha, a indignada entrevista da ministra ao Estado de S.Paulo (sexta, 4/4).
O resto, são pérolas aos porcos. Pregação (lenga-lenga reacionária) aos convertidos de sempre, cada vez mais desesperados com os índices de aprovação recorde do governo Lula e a destacada atuação da ministra Dilma, eventual candidata a sucedê-lo. Ao chafurdar em mais essa trapalhada, a oposição (imprensa, inclusive) credencia-se a prestar contribuição inestimável e definitiva à candidatura governista. Que venha 2010!
Nenhum comentário:
Postar um comentário