Diário Liberdade - [Antonio Carlos Mazzeo] "Não sei como", mas a PM tem meu endereço eletrônico ... e acreditem, me enviou um e-mail "explicativo" sobre a ação (desastrosa) daquela corporação no Pinheirinho ....
O e-mail, (noreply@policiamilitar.sp.gov.br) procurou justificar o injustificável, a partir de um conjunto de informações que misturaram, de modo quase infantil, o obviamente conhecido com distorções da realidade.
O mais incrível disso tudo, é que a PM/SP não admite sequer que possa ter havido excessos na sua ação. Nada, a não ser cínica autopromoção corporativa.
Objetivamente, a divulgação desse e-mail propagandístico reflete o desespero dessa corporação policial-militar diante do profundo desgaste e descrédito em relação à sociedade. Ainda que possam existir segmentos que apoiem e compartilhem a concepção de mundo existente na PM, a grande maioria da sociedade, de fato, não a vê com bons olhos.
A desconfiança da população é de tal monta que, surpreendentemente ouvi ontem, de uma apresentadora de um conhecido telejornal matutino, ao comentar mais uma das trapalhadas da PM/SP (na Marginal Pinheiros, em São Paulo, que acabou expondo a vida dos cidadãos em tiroteio irresponsável em meio ao trânsito e que provocou a morte de senhor aposentado) que quando a polícia chega "queremos chamar o ladrão"!
Tenho dito, em todas as vezes que me refiro às PMs, que essas corporações representam uma forma de organização policial obsoleta e decrépita, porque produto do período da ditadura militar-bonapartista, e em descompasso com um país que almeja a institucionalização da democracia em moldes clássico-burguês. Melhor dizendo, as PMs constituem uma uma herança da forma societal autocrática do período imperial, com formação das guardas nacionais, ou como foram designadas oficialmente, Corpo de Guardas Municipais Permanentes, criados no período regencial (1831 - 1840), momento de muitas revoltas populares, como a Cabanagem, no Pará, a Balaiada no Maranhão, a Sabinada na Bahia e a Guerra dos Farrapos, no Rio Grande do Sul, essa maior e mais longa, e com a participação da oligarquia dissidente do poder central. Todas essas revoltas foram afogadas em sangue, em brutais repressões para garantir tanto a unidade nacional ameaçada, como o poder das oligarquias hegemônicas e a autocracia de uma burguesia de caráter mercantil e agroexportadora.
De modo que esse corpo policial nasce para garantir não somente o poder central, como também os poderes regionais, sob comando dos latifundiários (no caso de São Paulo, o fazendeiro Tobias de Aguiar, não por acaso o patrono da PM/SP) todos promovidos a "coronéis" do Corpo de Guardas. Mais tarde, na República Velha, esse corpo de guardas transforma-se em Força Pública, mais uma vez a serviço das oligarquias autocráticas, com intuito de repressão dos movimentos populares, em especial, a Grave de 1917, em SP, Revolta dos Marinheiros e a revolta de Canudos, entre outras.
A ditadura militar-bonapartista, transformou essa força em Polícia Militar, ainda na perspectiva da autocracia burguesa, para reprimir os movimentos operário-populares e conter quaisquer possibilidades de oposição à ditadura.
Ora, o que podemos depreender desse sumaríssimo histórico, é que essa organização policial-militar, em seu núcleo genético, atua como corpo estranho à sociedade. Dizendo de outro modo, numa formação social de extração colonial, como a brasileira, onde a chamada "sociedade civil" (ou na definição de Marx, a sociedade civil burguesa -bürgerliche gesellschaft ) era "gelatinosa" e consequentemente fragmentada, utilizava-se desse tipo de força policial e, inclusive das forças armadas, para garantir a autocracia burguesa e a exclusão dos trabalhadores da vida e dos processos decisórios nacionais.
No momento histórico atual, onde a luta de classes aponta para um processo de democratização (aqui, no sentido das formulações lukacsianas) de longa-duração, uma das tarefas imediatas é reconstruir as instituições de poder do Estado e entre as prioridades, está a urgente restruturação das forças de segurança internas, quer dizer o conjunto da força de polícia. O que a sociedade deve discutir é o caráter de uma força policial, que obrigatoriamente deve ser cidadã e comprometida com a democracia, o que não encontra reverberação na atual conformação das arcaicas PMs. Não é mais possível deixar a segurança pública nas mãos de tecnocratas e de autocratas. A sociedade tem o direito e a obrigação de participar decisoriamente das políticas públicas de segurança.
Há que se afrontar urgentemente esse problema, há que se evitar que corpos policiais fiquem nas mãos de governadores despreparados e demagógicos, comprometidos com interesses locais ou de classe, que ignora de per si, os interesses gerais da sociedade.
Esta é uma tarefa que não pode ser adiada.
Antonio Carlos Mazzeo é professor da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho e membro do Comitê Central do PCB.
.
grifo meu [PK]
Fonte: Facebook do autor.
O mais incrível disso tudo, é que a PM/SP não admite sequer que possa ter havido excessos na sua ação. Nada, a não ser cínica autopromoção corporativa.
Objetivamente, a divulgação desse e-mail propagandístico reflete o desespero dessa corporação policial-militar diante do profundo desgaste e descrédito em relação à sociedade. Ainda que possam existir segmentos que apoiem e compartilhem a concepção de mundo existente na PM, a grande maioria da sociedade, de fato, não a vê com bons olhos.
A desconfiança da população é de tal monta que, surpreendentemente ouvi ontem, de uma apresentadora de um conhecido telejornal matutino, ao comentar mais uma das trapalhadas da PM/SP (na Marginal Pinheiros, em São Paulo, que acabou expondo a vida dos cidadãos em tiroteio irresponsável em meio ao trânsito e que provocou a morte de senhor aposentado) que quando a polícia chega "queremos chamar o ladrão"!
Tenho dito, em todas as vezes que me refiro às PMs, que essas corporações representam uma forma de organização policial obsoleta e decrépita, porque produto do período da ditadura militar-bonapartista, e em descompasso com um país que almeja a institucionalização da democracia em moldes clássico-burguês. Melhor dizendo, as PMs constituem uma uma herança da forma societal autocrática do período imperial, com formação das guardas nacionais, ou como foram designadas oficialmente, Corpo de Guardas Municipais Permanentes, criados no período regencial (1831 - 1840), momento de muitas revoltas populares, como a Cabanagem, no Pará, a Balaiada no Maranhão, a Sabinada na Bahia e a Guerra dos Farrapos, no Rio Grande do Sul, essa maior e mais longa, e com a participação da oligarquia dissidente do poder central. Todas essas revoltas foram afogadas em sangue, em brutais repressões para garantir tanto a unidade nacional ameaçada, como o poder das oligarquias hegemônicas e a autocracia de uma burguesia de caráter mercantil e agroexportadora.
De modo que esse corpo policial nasce para garantir não somente o poder central, como também os poderes regionais, sob comando dos latifundiários (no caso de São Paulo, o fazendeiro Tobias de Aguiar, não por acaso o patrono da PM/SP) todos promovidos a "coronéis" do Corpo de Guardas. Mais tarde, na República Velha, esse corpo de guardas transforma-se em Força Pública, mais uma vez a serviço das oligarquias autocráticas, com intuito de repressão dos movimentos populares, em especial, a Grave de 1917, em SP, Revolta dos Marinheiros e a revolta de Canudos, entre outras.
A ditadura militar-bonapartista, transformou essa força em Polícia Militar, ainda na perspectiva da autocracia burguesa, para reprimir os movimentos operário-populares e conter quaisquer possibilidades de oposição à ditadura.
Ora, o que podemos depreender desse sumaríssimo histórico, é que essa organização policial-militar, em seu núcleo genético, atua como corpo estranho à sociedade. Dizendo de outro modo, numa formação social de extração colonial, como a brasileira, onde a chamada "sociedade civil" (ou na definição de Marx, a sociedade civil burguesa -bürgerliche gesellschaft ) era "gelatinosa" e consequentemente fragmentada, utilizava-se desse tipo de força policial e, inclusive das forças armadas, para garantir a autocracia burguesa e a exclusão dos trabalhadores da vida e dos processos decisórios nacionais.
No momento histórico atual, onde a luta de classes aponta para um processo de democratização (aqui, no sentido das formulações lukacsianas) de longa-duração, uma das tarefas imediatas é reconstruir as instituições de poder do Estado e entre as prioridades, está a urgente restruturação das forças de segurança internas, quer dizer o conjunto da força de polícia. O que a sociedade deve discutir é o caráter de uma força policial, que obrigatoriamente deve ser cidadã e comprometida com a democracia, o que não encontra reverberação na atual conformação das arcaicas PMs. Não é mais possível deixar a segurança pública nas mãos de tecnocratas e de autocratas. A sociedade tem o direito e a obrigação de participar decisoriamente das políticas públicas de segurança.
Há que se afrontar urgentemente esse problema, há que se evitar que corpos policiais fiquem nas mãos de governadores despreparados e demagógicos, comprometidos com interesses locais ou de classe, que ignora de per si, os interesses gerais da sociedade.
Esta é uma tarefa que não pode ser adiada.
Antonio Carlos Mazzeo é professor da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho e membro do Comitê Central do PCB.
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grifo meu [PK]
Fonte: Facebook do autor.