28 de out. de 2007

O relatório McKinsey sobre educação.

Recursos e resultados

Tony Blair mudou quase todos os aspectos da política educacional na Inglaterra e no País de Gales, e em muitos casos mais de uma vez. (...) A única coisa que não mudou foram os resultados (...) e isso ao longo dos últimos 50 anos. A Austrália quase triplicou seus gastos por aluno, de 1970 para cá. Nenhuma melhora. Nos Estados Unidos, os dispêndios quase dobraram depois de 1980, e os tamanhos das turmas são os menores de todos os tempos. Uma vez mais, resultado algum.

Os melhores países

Elas foram avaliadas e reavaliadas pelo Pisa (Programa de Avaliação Internacional de Estudantes), da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), e isso serviu para estabelecer, primeiro, que os países de desempenho mais forte se saem muito melhor do que os piores e, segundo, que os mesmos países lideram essas avaliações, a cada vez que são realizadas: Canadá, Finlândia, Japão, Cingapura, Coréia do Sul. (...) Cingapura gasta menos dinheiro por aluno do que a maioria dos demais países. Tampouco de períodos mais longos de estudo: os alunos finlandeses começam as aulas mais tarde, e estudam menos horas, do que os dos demais países ricos.

Contratar os melhores

O primeiro passo é contratar os melhores. Não resta dúvida de que, como declarou um funcionário do governo sul-coreano, "a qualidade de um sistema educacional não pode superar a qualidade de seus professores". Estudos feitos no Tennessee e em Dallas mostraram que, se alunos de capacitação média forem entregues a professores que estão entre os 20% mais competentes de sua profissão, terminam se posicionando entre os 10% de estudantes com melhor desempenho; caso os professores que os ensinam venham dos 20% menos competentes, os alunos terminam entre os 10% de pior desempenho.

A qualidade dos professores exerce a maior influência sobre o desempenho dos alunos.Mas a maioria dos sistemas escolares não se esforça demais para selecionar os melhores. A Nova Comissão sobre a Capacitação da Força de Trabalho dos Estados Unidos, uma organização sem fins lucrativos, diz que as escolas norte-americanas tipicamente recrutam professores que estão no terço mais baixo de desempenho, entre os formandos das universidades.

A cidade de Washington recentemente contratou como diretora-geral de suas escolas públicas uma integrante da organização Teach for America, que identifica os melhores formandos e os contrata para lecionar por dois anos. Tanto a indicação da diretora quanto a organização que ela representa geraram grande controvérsia.

Paradoxo da turma menor

Quase todos os países ricos vêm tentando reduzir os tamanhos de suas turmas escolares, nos últimos anos. Mas, se não houver outras variações, turmas menores querem dizer mais professores a serem contratados com a mesma verba, o que reduz o salário médio e o status profissional da categoria. Isso pode explicar o paradoxo de que, depois da educação básica, parece haver pouca ou nenhuma correlação entre o tamanho das turmas e as realizações educacionais.

Os melhores profissionais

Na Finlândia, todos os novos professores precisam ter mestrado. A Coréia do Sul contrata professores de ensino básico entre os 5% de formandos com melhor desempenho, Cingapura e Hong Kong entre os 30% de melhor desempenho. (...) Na prática, os países com melhor desempenho pagam salários não superiores à média.

E eles tampouco tentam atrair um grande quadro de interessados para selecionar entre eles os mais bem sucedidos. Quase que o contrário. Cingapura avalia os candidatos rigorosamente antes de admiti-los aos cursos de formação de professores e aceita apenas o número de candidatos suficiente para cobrir as vagas nos quadros da educação. A Finlândia também limita a oferta de cursos de treinamento de professores à demanda. Em ambos os países, o ensino é uma profissão de status elevado (porque é altamente competitiva), e os fundos destinados a cada professor em treinamento são generosos (porque o número deles é baixo).

A competição como motivação

A Coréia do Sul demonstra como os dois sistemas produzem resultados diferentes. Seus professores de ensino básico têm de obter um diploma de graduação em uma de apenas 12 universidades. A admissão requer notas altas; o número de vagas é racionado de acordo com o número de postos de ensino em aberto. Em contraste, os professores de escolas secundárias podem obter seus diplomas em qualquer uma das 350 faculdades do país, e os critérios de seleção são mais frouxos. Isso gera um enorme excedente de professores secundários recentemente qualificados -cerca de 11 por vaga, de acordo com as mais recentes estatísticas. Como resultado, o ensino secundário é uma profissão com menos status na Coréia do Sul, onde todo mundo prefere trabalhar no ensino básico. A lição parece ser a de que a admissão aos sistemas de treinamento de professores precisa ser difícil, e não fácil.

Ensinando os professores

Cingapura provê cem horas de treinamento aos seus professores a cada ano e aponta professores veteranos para supervisionar o desenvolvimento profissional em cada escola. No Japão e na Finlândia, grupos de professores visitam as classes de colegas e planejam aulas juntos. Na Finlândia, professores têm uma tarde de folga semanal com esse objetivo. Em Boston, cidade cujo sistema educacional demonstra um dos melhores ritmos de progresso nos EUA, os cronogramas de aulas são organizados de forma a permitir que os professores das mesmas disciplinas tenham períodos de folga coincidentes, para que possam planejar juntos. Isso ajuda a difundir as melhores idéias.

Como apontou um educador, "quando um professor norte-americano brilhante se aposenta, quase todos os planos de aula e práticas que ele desenvolveu também são aposentados. Quando um professor japonês se aposenta, deixa um legado".

Sistemas de avaliação

Nos últimos anos, quase todos os países começaram a dedicar mais atenção aos processos de avaliação, a mais comum maneira de verificar se os padrões estão em queda. A pesquisa da McKinsey é neutra quanto à utilidade do método, apontando que, embora Boston teste todos os alunos anualmente, a Finlândia em larga medida abriu mão de exames nacionais.

De maneira semelhante, escolas na Nova Zelândia e na Inglaterra são testadas a cada três ou quatro anos, e os resultados são divulgados em público, enquanto a Finlândia, líder mundial na educação, não tem processo formal de revisão e mantém sigilo sobre os resultados de suas auditorias informais.

Reforço

Mas existe um padrão quanto ao que os países fazem quando os alunos e as escolas começam a falhar. Os países de melhor desempenho não hesitam em intervir, e o mais cedo possível. A Finlândia dispõe de mais professores de educação especial encarregados de ensinar os alunos retardatários do que qualquer outro país -em certas escolas, chega a ser um professor em cada sete.

A cada dado ano, um terço dos alunos recebe educação suplementar em sessões individuais. Cingapura oferece aulas adicionais aos 20% de alunos com desempenho mais fraco, e existe a expectativa de que os professores fiquem na escola depois das aulas -ocasionalmente por horas- a fim de ajudar os alunos.

Luis Nassif. O verdadeiro Blog dos Blogs, clique aqui

A verdadeira bolsa-esmola?

Vem aí o ‘bolsa-professor’

MEC pagará R$ 350 para incentivar estudantes de licenciatura a não abandonar a carreira

Maria Luisa Barros e Daniela Dariano

Rio - Depois do bolsa-escola, o ‘bolsa-professor’. Para manter mestres na sala de aula — como universitários de licenciatura e também como instrutores da Educação Básica na rede pública —, o Ministério da Educação (MEC) dará 20 mil bolsas de incentivo à docência a partir de março: 10 mil para projetos desenvolvidos de fevereiro a dezembro e 10 mil para agosto a dezembro. O benefício será de R$ 350 mensais para cada universitário que tiver projeto selecionado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

O Programa de Bolsa Institucional de Iniciação à Docência (Pibid), antecipado por O DIA em agosto, terá R$ 75 milhões em 2008 para combater a evasão de profissionais do magistério. Pesquisa do MEC divulgada há uma semana mostrou que 71,2% dos professores formados não atuam na Educação Básica da rede pública.

RIO ESTÁ NO PÁREO

Os universitários do Rio estão no páreo das seleções anuais para as bolsas. Isso porque as redes estadual e municipal do Rio têm índices de desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) abaixo da média nacional (3,8) e esse é o primeiro critério para a escolha. O Ensino Médio nas escolas estaduais do Rio tem nota média de 2,8; o Fundamental da 5ª à 8ª tirou 2,9 nas estaduais e 3,7 nas municipais.

O Pibid atenderá inicialmente alunos de licenciatura em Física, Química, Biologia, Matemática, Letras, Pedagogia e Educação Artística das federais, mas deverá ser ampliado. A portaria será publicada até o fim do mês e o edital de seleção, em seguida. As regras para escolha de projetos incluem inovação e capacidade de superar problemas de aprendizagem dos alunos de uma ou mais escolas. Os bolsistas atuarão em laboratórios ou oficinas extraclasse enquanto cursam a faculdade.

O objetivo é antecipar o vínculo entre os futuros mestres e as salas de aula da rede pública, já que o estágio obrigatório só começa no penúltimo período. Para a secretária de Educação Básica do MEC, Maria do Pilar Lacerda, o programa criará compromisso com o magistério após o fim do curso.

Hoje, professor graduado não é sinônimo de mestre na rede pública. A maioria dos alunos da licenciatura tem planos distantes dessa realidade. Os que querem ensinar, sonham fazê-lo na universidade. “Desmotiva muito, não só o salário, mas a dificuldade de lidar com os alunos. Diminuiu muito a autoridade do professor, principalmente em áreas de risco. Dá insegurança”, admite o estudante do 2º período de Matemática na Uerj Karlos do Amaral, 20 anos.

Ele vê a bolsa como um incentivo. O exemplo do pai, professor de Ciências em Ciep de Magé, orgulha e assusta: “Vejo sua luta: os alunos não querem estudar, tem muito repetente e gente com dificuldades em Português, Matemática. Meu pai tenta orientar em outras áreas também”.

Ao antecipar o contato com a rede pública, o Pibid teria dois possíveis efeitos, acredita a estudante de Geografia da Uerj Rejany Ferreira dos Santos, 28: “Diante de todas as dificuldades, os bolsistas podem se apaixonar ou desistir de vez”.

Evasão ainda na faculdade

Livros e fotocópias caros, passagens diárias e falta de tempo para trabalhar são barreiras que fazem com que as turmas de licenciatura nas universidades se reduzam período a período até a diplomação. É aí que o Pibid deverá fazer diferença.

Estudante de Geografia da Uerj, Rejany Ferreira dos Santos faz o último período do curso, mas só se formará no ano que vem, pois deixou de estudar matérias do início da faculdade, quando trabalhava como secretária numa gráfica para se sustentar.

“A bolsa será importante para manter o aluno na faculdade. Minha turma começou com 45 e agora somos 30”, conta Rejany, que não teve Matemática na 6ª série do Ensino Fundamental por falta de professor e é exceção entre os colegas: deseja ser mestre da rede pública. “A maioria dos meus amigos não quer. Quando se fala em curso da Polícia Federal, o olho de uma colega minha brilha. Há desânimo com relação à docência”, conta.

Fonte O Dia, aqui.

RJ . É o estado com menos alunos na rede pública no ensino básico

Ensino público ruim empurra para rede privada

Quanto pior a rede, maior o número de pobres pagando para estudar

A proporção de estudantes de todas as classes sociais no ensino público varia dependendo da região do País - um indício de que redes mais estruturadas podem atrair e manter os alunos de várias faixas de renda. Nos Estados mais pobres, onde estudantes de rede pública apresentam baixo desempenho em avaliações nacionais, há uma maior tendência de famílias migrarem para o ensino privado. Em contrapartida, nas regiões mais ricas e nas quais o aluno do sistema público tem notas acima da média nacional, há maior porcentagem de todas as classes sociais nas escolas municipais e estaduais.

A conclusão aparece na pesquisa do Ibmec São Paulo ao se analisar o perfil dos alunos das escolas e a presença deles por classe social na rede privada e pública. Por exemplo, enquanto a média nacional é de cerca de 80% de crianças e adolescentes em idade escolar na rede pública, no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina e no Paraná a porcentagem chega a 90%. Os três Estados tiveram desempenho acima da média nacional na Prova Brasil, aplicada a todos os estudantes pelo Ministério da Educação (MEC).

Já Rio e Distrito Federal representam a menor porcentagem na rede pública, com cerca de 70%. “O Rio de Janeiro é onde aparece a maior contradição. É o Estado com menos alunos na rede pública no ensino básico, mas que tem mais estudantes nas universidades públicas. Somado a isso, há uma concentração de instituições federais de ensino superior no Rio”, explica Naércio Menezes Filho, professor do Ibmec São Paulo e autor da pesquisa que analisa o gasto das famílias com educação no Brasil. “Já o Distrito Federal tem características populacionais diferentes, com classe baixa nas cidades satélites. Isso pode influenciar no resultado”, afirma.

Em São Paulo, a diferença aparece no custo das mensalidades em todos os níveis de ensino. No Estado, os preços são três vezes mais altos do que na média do País. A proporção é maior do que a registrada em outros itens de consumo, que caracterizam a cidade com um alto custo de vida.

“Eu estudei em escola pública até o fim, tenho diploma, mas não aprendi. Não fui para a faculdade. Achava muito ruim, então prefiro economizar, não gastar comigo. Meu marido também faz sacrifícios para podermos colocar nosso filho numa escola paga”, afirma a vendedora Cristiane Manzano Santos, de 25 anos. Ela é mãe de um garoto de 8 anos que está na 2ª série de um colégio privado na zona sul de São Paulo e de uma bebê de dois meses que ainda não vai para a escola e passa o dia com a avó.

“É difícil. A gente atrasa (o pagamento) alguns meses, depois negocia com a diretora, volta a pagar. Mas espero que, com isso, ele consiga um emprego melhor do que o meu no futuro. Posso não deixar muita coisa para ele, mas quero deixar pelo menos o estudo”, afirma o pai, Lázaro Santos, de 29 anos, que trabalha como motoboy para uma empresa.

Fonte Estadão. Clique aqui.


27 de out. de 2007

PROFESSOR: PROFISSÃO PERIGO

Maria de Fátima Franco dos Santos


Ser professor atualmente é viver correndo risco, seja quanto à violência existente dentro da escola ou em suas imediações. Tal violência ocorre quando alunos cometem vários tipos de crimes, como por exemplo, dano ao patrimônio através de pichações de mau gosto, lesão corporal, tráfico, constrangimento, ameaças e até mesmo homicídio. Tais crimes, são apenas alguns dos lamentáveis episódios que infelizmente estão fazendo parte do cotidiano escolar.

A rivalidade e a baixa tolerância existem não apenas entre os colegas de ‘escola’, mas também, contra a figura do professor, que em muitas vezes, se sente completamente impotente e desprotegido, por mais que os responsáveis pela administração das escolas tentam fazer, também eles, nem sempre dão conta e sucumbem à violência.

Agressão verbal do aluno ao professor, que até pode ser considerada como uma violência mais leve, já mostra o descaso que existe com o principal objetivo da escola, que é ‘educar’, complementar à educação familiar no que tange aos bons modos para o relacionamento entre as pessoas.

Professores são humilhados diante da classe, por alunos sádicos que fazem da sala de aula uma das ‘arenas’ em que atuam destrutivamente. Em muitos casos, a primeira demonstração de forças destes alunos é exatamente eleger como alvo o professor, intimidando-o e controlando-o através de ameaças das mais diversas possíveis.

Facções criminosas são objeto de apologia e admiração de alunos, como se fossem os melhores exemplos a serem seguidos. O poder, através da violência, da arma e da droga, nestes casos, está substituindo o espaço de saber e fraternidade que deveria existir nas instituições educacionais.

O estresse está avançando a cada dia, e de modo severo, entre os professores, também, num cenário de terror que toma conta de certos momentos em algumas escolas, só poderia ocasionar uma doença como esta, que pode até mesmo levar à morte quem dela padece.

Estranhamente, o trabalho do professor está se aproximando daquele desempenhado pelo policial, em termos de ser uma profissão de risco, aonde o perigo não é apenas uma fantasia, mas o cotidiano de muitos deles.

No passado, a carreira docente era motivo de orgulho para uma pessoa, hoje, é motivo de medo, em muitas escolas. É preciso mudar esta triste realidade a que são submetidos tantos educadores, ou futuramente, que país teremos?


MARIA DE FÁTIMA FRANCO DOS SANTOS

Professora do Curso de Psicologia da PUC-CAMPINAS

Colunista do Jornal Correio Popular, Campinas, SP

19 de out. de 2007

SOBRE O JORNALISMO COVARDE E PÚTRIDO E, COMO DESPREZAR OS DESPREZÍVEIS

O “jornalismo de esgoto”, a pauta torta e a intolerância.

No artigo dessa semana pretendia tratar dos mais de 250.000 empregos formais (com carteira assinada) gerados no mês de setembro passado e também dos cerca de US$200 bilhões em investimentos, previstos para os próximos cinco anos no planejamento de algumas grandes empresas como Petrobrás, Vale do Rio Doce e Votorantim, e de mais uma siderúrgica que será instalada no estado do Maranhão, num investimento de mais US$4,5 bilhões – e sobre os benefícios e vertiginosos efeitos multiplicadores desses fatos na economia, em nossas vidas e, claro, no desenvolvimento do país. Mas, sem deixar de fazer a necessária ressalva em relação ao conservadorismo da diretoria do Banco Central, que já se tornou deletério ao país. Sem deixar de falar também nos graves problemas na área da saúde nos estados (epidemia de dengue), da segurança pública e na grave crise da educação em SP.

Pretendia tratar aqui desses assuntos, digamos, mais nobres, relevantes e importantes para todos nós, cidadãos dessa grande nação ainda em construção. Abordar a pauta que importa e não a pauta da impostura, essa outra pauta, torta, que nos é imposta diariamente pelos sacripantas da mídia em seu jornalismo de esgoto. Pretendia. Não será possível, porém, fazê-lo da forma desejada, pois me sinto compelido a abrir aqui um breve parêntese.

Lembro-me, perfeitamente bem, que já havia lhes sugerido, aqui mesmo na Carta Maior, em crônica publicada anteriormente, o desprezo aos desprezíveis – no caso, os jornalistas e intelectuais que, por suas palavras, textos e ações, seriam merecedores do nosso mais completo desprezo. Porém, nem sempre, reconheço agora, o mero desprezo (aos desprezíveis) parece ser suficiente para, se não emudecer, ao menos constranger essas vozes (e penas) maledicentes (pagas, e muito bem pagas, pela direita para fazer o serviço sujo) – creio não ser suficiente relegá-las ao merecido/devido olvido.

Já disse também, em um artigo anterior, que nem tudo é permitido na disputa política e no debate – há que se evitar as diatribes, os xingamentos e a arrogância/petulância, portas de entrada da intolerância. O debate público deve propiciar uma cordata troca de idéias, e assim, quem sabe, algum ganho para contendedores e leitores.

Tratei, aqui nesse espaço, de forma secundária, e com a devida ponderação, por exemplo, do caso Renan – ou “Renangate”, como queriam alguns. Uma pauta que tentaram, por diversas e reiteradas vezes, por diversos dias, nos empurrar goela abaixo e que monopolizou o debate político por mais de quatro meses. Estaria com isso fazendo a defesa de políticos corruptos, ou sendo leniente ou conivente com estes? Evidente que não! Sejamos honestos, nos livramos de um, mas não será exterminando um só gafanhoto que salvaremos a nossa lavoura, já demasiada arcaica, dessa verdadeira praga. Finalmente, ao que parece, estamos livres de Renan. Mas e os outros?

Quanto tempo perdido, não? Gastaram muita vela para pouco (e mau) defunto. Enquanto isso – enquanto todos os olhos e ouvidos da sociedade se voltavam para esse caso –, inúmeros projetos de lei criavam poeira nos escaninhos e gavetas do legislativo, as reformas essenciais ao país, como a tributária e a política, só para citar duas delas, estão (ainda) paradas, não andam. Questões importantes como a discussão sobre a CPMF, sua redução ou sua extinção progressiva e paulatina (uma vez que não dá para acabar com um imposto tão importante numa “canetada”, de forma voluntarista) ou a melhoria do nosso quadro/sistema político (impondo impedimentos legais, por exemplo, à promiscuidade entre políticos e empresas privadas). Essas importantes questões só serão resolvidas, de uma maneira séria, através dessas reformas – o resto é mera cortina de fumaça ou “manchetismo” e sensacionalismo baratos e hipócritas para vender jornais e revistas.

A pauta torta, porém, prossegue travestida em suas diversas e chamativas “verdades” – que mais parecem, diga-se, coloridos badulaques. Um “luminar” das trevas do jornalismo de esgoto lança um livro cujo título é um desrespeito ao presidente da República. Um outro diz que alguns livros didáticos distribuídos gratuitamente pelo governo fazem doutrinação política ou ideológica (proselitismo). E seguem testando hipóteses e nos impondo imposturas.

Em outro front perde-se um tempo precioso. Manchetes e mais manchetes... Artigos de fundo são redigidos e publicados com pompa e circunstância, antropólogos e psicanalistas se manifestam, centenas de cartas de leitores são enviadas às redações, um representante do bom-mocismo global ganha capa em duas revistas semanais e um jovem escritor da periferia teve seu quinhão do direito a vez e voz. Os dois contendores dessa falsa polêmica foram execrados, exaltados, depois esquecidos. Todo esse debate foi ocasionado, você sabe, pelo furto de um relógio, de uma marca tanto cara quanto “brega”, de uma celebridade. Enquanto isso, no mundo real, jovens mães jogam seus recém-nascidos nos esgotos, lixões e sarjetas. E a violência urbana ganha características de uma pandemia.

Por outro lado, você pode até pensar que é mera falta de assunto dos jornalistas. Mas não é. É a pauta que está torta mesmo.

Um outro exemplo, ou um outro front: as reiteradas notícias, reportagens e manchetes que tratam, notadamente agora, mas já o fazem há muito (creio que desde o primeiro dia após a posse), da eleição para a Presidência em 2010. São, na verdade, apenas uma estratégia sub-reptícia de interdição do atual governo – pasme, você tem todo direito de não acreditar, mas já teve “jornalão” que deu manchete para uma possível candidatura Lula em 2014! Parece inacreditável, risível até, mas essa foi a manchete de primeira página do jornal Folha de S.Paulo no dia 14 de outubro último. Já começaram até as pesquisas de intenção de voto! A indústria do voto começa a funcionar a todo vapor.

A estratégia subliminar é óbvia: esvaziar o segundo mandato do presidente Lula. Ao invés de tratar sobre os inúmeros problemas que afligem os brasileiros; ao invés de focar as mudanças e transformações que estão ocorrendo, e, em paralelo, cobrar ações e políticas públicas do governo, a grande imprensa resolveu “encerrar” precocemente o mandato presidencial. Não importando se estamos apenas em meados do décimo mês do primeiro ano do segundo governo de um presidente eleito com o voto da esmagadora maioria dos brasileiros. Não importando, tampouco, se o país necessita fazer reformas urgentes e necessárias, e aproveitar assim o empuxo favorável e o ciclo virtuoso por que passa sua economia. Os ventos não nos serão para sempre favoráveis.

Aliás, o país, na escrita canhestra dessa pauta torta, é o que menos importa.

[Recebi e-mail de um leitor, indignado, contendo post do blog de um desses jornalistas de esgoto. O texto contém inacreditáveis vitupérios e diatribes endereçados ao jornalista Alberto Dines. Contém adjetivações e acusações extremamente graves e covardes. Chega a ser cruel, desumano até.

O autor desse verdadeiro linchamento retórico ao jornalista Dines (do qual, aliás, discordo de quase tudo que diz, mas por quem tenho o maior respeito) é um dos mais sórdidos da mídia brasileira (trata-se do mesmo “para-jornalista” que num dia esculhamba o Mino Carta; no outro, avacalha o Luis Nassif; no dia seguinte, o Paulo Henrique Amorim; depois, o Elio Gaspari, em seguida o Flávio Aguiar, depois o Jânio de Freitas; depois a Helena Chagas; depois a Tereza Cruvinel; depois... E por aí segue em sua toada infamante – talvez, quem sabe, como uma estratégia de chamar a atenção para sua pequenez petulante. Como ninguém lhe dá bola (lembre-se do “desprezar os desprezíveis”), ele apenas prossegue, todos os dias, a lançar seus dejetos e sua cólera no esgoto – seja em seu blog ou na revista que lhe dá guarida, situada às fétidas margens do Rio Pinheiros, na capital paulista, mas que deságua sua retórica odienta e vil por todo o país.

Apesar de já acumular razoável vivência e experiência no jornalismo, em variadas polêmicas e nos mais renhidos debates de idéias, causou-me forte mal-estar, assombro e estranheza, perceber (e aprender) que o espírito do homem poderia descer a níveis tão baixos.

Assim como muitos dos meus leitores, não concordo com todas as idéias e opiniões do jornalista Alberto Dines (bem como com as opiniões e idéias de muitos dos aqui citados), mas tenho por ele enorme consideração e respeito. Ninguém é infalível ou santo, isento de pecados, decerto, ou imune a erros e equívocos. Mas todos merecemos, no mínimo, o devido respeito e/ou a mínima cordialidade.

Lula Miranda é economista, poeta e cronista. É secretário de Formação para a Cidadania do SEEL – Sindicato dos Trabalhadores em Editoras de Livros do Estado de SP. Integra o Coletivo de Formação da CUT São Paulo.

Lula Miranda

15 de out. de 2007

LIVRO DIDÁTICO

Ninguém faz a cabeça de quem lê. Só o leitor

Por Deonísio da Silva em 9/10/2007

A Câmara Brasileira do Livro (CBL) informa que em 2006 o governo foi o maior comprador de livros do mundo. E comprou bem baratinho. Cada um dos 96.910.126 volumes custou 6,35 reais; para tanto, desembolsou 616 milhões de reais. Neste caso, aproveitou muito bem o dinheiro público. Que livro o leitor pode comprar por 6,35 reais? Cada exemplar custou menos do que uma revista, com o agravante de que livro não tem anúncio. Nem na capa, nem nas páginas internas.

Foi um avanço em relação a 2005, quando comprara 65.182.040 exemplares ao preço médio de 5,78 reais, pagando 377 milhões de reais.

Foi de Ana Paula Sousa, em CartaCapital, uma das melhores reportagens sobre o livro didático, ao deslindar o contexto das denúncias feitas pelo jornalista Ali Kamel em O Globo (18/9/2007): "Nossas crianças estão sendo enganadas, a cabeça delas vem sendo trabalhada. Algo precisa ser feito, pelo ministério, pelo congresso, por alguém" [ver "A polêmica sobre a nova história"].

O juízo de Ali Kamel é de uma obviedade atroz, mas isso não foi destacado por ninguém. Nem por CartaCapital. Evidentemente, também a cabeça de Ali Kamel, assim como a deste colunista, "foi trabalhada" nas escolas que ambos freqüentaram, ambos "foram enganados" quando crianças e nada foi feito por nenhum "ministério, congresso, por alguém". Ambos, por certo, leram muitos outros livros. E assim nenhum dos dois continuou enganado.

Alunos sempre foram "enganados"

Na escola, aprendi que Alexandre tinha sido um grande homem, um dos maiores de todos os tempos. Um dia topei com este parágrafo no Sermão do Bom Ladrão, do padre Antônio Vieira:

"Navegava Alexandre em uma poderosa armada pelo Mar Eritreu a conquistar a Índia, e como fosse trazido à sua presença um pirata que por ali andava roubando os pescadores, repreendeu-o muito Alexandre de andar em tão mau ofício; porém ele, que não era medroso nem lerdo, respondeu assim. `Basta, senhor, que eu, porque roubo em uma barca, sou ladrão, e vós, porque roubais em uma armada, sois imperador?´ Assim é. O roubar pouco é culpa, o roubar muito é grandeza; o roubar com pouco poder faz os piratas, o roubar com muito, os Alexandres".

Todos os alunos sempre foram enganados sobre outros assuntos. Ensinaram-lhes o número errado de planetas; ensinaram-lhes que a democracia grega era exemplar (como, se votavam cerca de 200 pessoas representando uma cidade inteira?); ensinaram-lhes a odiar Nero, que incendiou Roma (mas não lhes ensinaram que ele fez a reforma agrária na África, o que Santo Agostinho reconhece de passagem, num livro sobre música); ensinaram-lhes primeiramente que Getúlio Vargas foi "pai dos pobres" e depois que foi "mãe dos ricos"; ensinaram-lhes que ele era amado, depois que ele era odiado, mas para isso tiveram que omitir que ele, deposto, foi reeleito pelo povo e que, apesar de tantas denúncias, não era corrupto, nem havia mar de lama no Palácio do Catete, apenas uma pocinha. Ainda menor se comparada com os governos de hoje. Etc.

Nos anos 1970, o escritor Osman Lins debateu-se quase solitário em livros como Problemas Inculturais Brasileiros e Guerra sem Testemunhas. Ninguém lembrou este autor ao escrever sobre o que ele tanto denunciou.

Trajetória de Paulo Renato

Fazer a cabeça das crianças é coisa muito antiga. Alguns livros de referência – mas nossos jornalistas, por norma, lêem pouco e por isso não podem referir livros que não leram – poderiam ajudá-los, como é o caso de Para Ler o Pato Donald, de Ariel Dorfman e Armand Mattelart, escrito num período em que o governo de Salvador Allende enfrentava o jogo sujo do governo dos EUA, cujos funcionários ajudaram a assassinar o presidente e seus ministros. E Augusto Pinochet, o ditador que os EUA tanto ajudaram, foi para a cadeia na Inglaterra, anos depois. E semana passada a viúva e os filhos foram presos no Chile, acusados de corrupção. Também é bom ler Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron, A reprodução. Elementos para uma teoria do sistema de ensino.

Ana Paula Sousa destacou, em CartaCapital, que as denúncias de doutrinação petista não procediam: o livro que serviu de cavalo de batalha, Nova História Crítica (Nova Geração Editorial, 319 páginas), de Mario Schmidt, foi escolhido no governo de Fernando Henrique Cardoso.

A jornalista lembrou também que Paulo Renato Souza, ministro da Educação nos dois governos de FHC, tornou-se consultor do grupo editorial Santillana, líder de vendas de livros para o governo federal.

Mas diz pouco sobre o ex-ministro. Ex-reitor da Unicamp, onde enfrentou uma dura onda de calúnias antes de ser eleito para a reitoria, trabalhou também no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e, em São Paulo, foi secretário da Educação no governo Franco Montoro.

Heranças benditas

Paulo Renato Souza, deputado federal (PSDB-SP), se nada tivesse feito no MEC, apenas este programa de compras de livros, depois objeto de sucessivos aperfeiçoamentos, teria deixado seu nome na história como líder de um projeto que seguiu o conselho dado por Castro Alves, ainda no século 19, enaltecendo o livro em seu belo poema O Livro e a América:

"Oh! Bendito o que semeia/ Livros à mão cheia/ E manda o povo pensar!/ O livro, caindo n´alma/ É germe – que faz a palma,/ É chuva – que faz o mar!"

Que seja criticado por seus defeitos, não por suas qualidades. O que ele fez com a política de livros, fez também com o processo de avaliações nas universidades, ainda excessivamente quantitativas, mas ainda assim avaliações. Antes dele, as avaliações, ou não existiam, ou eram pífias.

O governo Lula soube manter políticas deflagradas por seu antecessor (no primeiro mandato; agora o antecessor dele é ele mesmo) de que são exemplos a bolsa-escola, a avaliação das universidades e a compra de livros, aperfeiçoando essas boas iniciativas, mas infelizmente o presidente e a mídia insistem em comparações equivocadas, referindo-se à "herança maldita". Neste caso, foram três heranças benditas. Tanto que as manteve.

Ajustes indispensáveis

O jornalista LuIs Nassif foi direto ao assunto no seu blog:

"As campanhas recentes contra livros didáticos têm como pano de fundo um mercado milionário. Só para 2008, as compras do MEC chegarão a R$ 186,7 milhões para o ensino médio e em R$ 560 milhões para o fundamental. Desse total, a Moderna (controlada por capital espanhol) vendeu R$ 212 milhões, R$ 125 milhões a mais que no ano anterior. O ex-ministro da Educação Paulo Renato de Souza é consultor da empresa."

Nassif lembrou também outra coisinha. "A editora Abril, que edita a Veja, sempre tão impiedosa com o governo Lula, vendeu, para 2008, R$ 162 milhões ao MEC através de suas controladas editoras Ática e Scipione", um aumento de R$ 73 milhões em relação a 2007!

O colunista deu outra nota esclarecedora: "A editora Saraiva vendeu R$ 98 milhões para 2008 contra R$ 39,2 milhões em 2007". E concluiu: "Dentre as dez maiores, há pouco espaço para pequenas editoras ou autores individuais."

Mario Schmidt, o Paulo Coelho dos livros didáticos, vendeu milhões de exemplares. Mas o governo não obrigou as escolas a adotar o seu Nova História Crítica. Ele foi escolhido por uma comissão de professores.

De pequenos ajustes indispensáveis, e que já estão sendo feitos, fizeram um cavalo-de-batalha para criticar o governo Lula. Miraram em Fernando Haddad e acertaram em Paulo Renato Souza. Nos dois casos, os alvos estão errados. O que precisa ser atacado é o problema, não os dois ministros. Um criou o programa, outro o manteve, como já fizera Tarso Genro, aperfeiçoando-o. E o programa é bom.

Eternos são os livros

Que houve acerto, já sabemos. Antes, muitos alunos nada liam porque não havia livros. Agora lêem, e lêem mal, em muitos casos, porque os livros escolhidos não foram os melhores.

Está de bom tamanho. Mudemos os livros, aperfeiçoemos as formas de escolha e daremos mais um passo à frente. O principal já foi dado: o Brasil tem um projeto de livro didático.

Qual é a responsabilidade da mídia? Deixar de ser irresponsável, deixar de tomar partido a priori, sem examinar, com a devida isenção, o problema.

O que tem havido é um combate que deveria dar náuseas em qualquer intelectual: abdicar de sua capacidade crítica para endossar ou reprovar um governo, qualquer que seja ele.

Todo governo passa, dure quatro, oito ou mais anos. O intelectual, porém, tem no mínimo a vida inteira para ser examinada sua contribuição ao país. E, se deixar livros, nem a morte impedirá que ele continue na berlinda, pois eternos são os livros, não os autores.

http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=454AZL001

11 anos e a mesma política de arrocho salarial


Maria Beatriz Lugão Rios, coordenadora geral do Sepe e professora da rede estadual de ensino.

Beatriz Lugão - Essa questão do achatamento salarial não é só do professor. É uma luta maior e é também dos demais funcionários das escolas. E salário de funcionário a gente não pode nem falar que sofreu achatamento, porque nunca teve um teto maior. Mas começou um achatamento mais visível para nós na década de 90, quando os governos começaram a trabalhar com gratificações, deixando o piso congelado. Assim, da implementação do Plano de Carreira que nós conquistamos na década de 80, que são nove níveis, com 12% cumulativos entre os níveis, isso não está sendo aplicado.

O que a gente estranha nisso tudo é que justamente aqueles que começaram a implementar esse tipo de achatamento mais visível na década de 90 foram governos de oposição ao projeto neoliberal, são oposição ao projeto neoliberal, que são contrários ao achatamento de salário da classe trabalhadora, contrários às demissões, contrários à exclusão do aposentado de qualquer política salarial.São justamente esses governos que começaram com alinhamento, na nossa maneira de ver, com essa política neoliberal, porque senão nada justificaria o que a gente tem hoje. O governo eleito no Estado do Rio de Janeiro com a bandeira da oposição ao governo FHC, ao projeto neoliberal, é um governo que tem mantido o aposentado afastado de qualquer política salarial. Por que estou dizendo isto? Porque nós hoje temos uma série de gratificações que compõem o salário e não temos a paridade para o aposentado. A gente corre escolas e vê pessoas com 30, 35 anos de trabalho, que estão dobrando, triplicando às vezes sua carga horária para conseguir aumentar sua renda. E não podem se aposentar para não perder quase todo o salário.

Há professores que estão trabalhando numa jornada de 7 horas da manhã até 10 horas da noite, com turmas de primeira à quarta série, para poder fazer a GLP (NR: Gratificação de Lotação Prioritária), pegando turmas pela manhã, outra à tarde e outra à noite. E se ela se aposenta, vai reduzir o seu salário, e muito, até porque o projeto Nova Escola, do Governo do Estado, não se estende ao aposentado. Os que se aposentam perdem mais da metade do salário. Isto tem roubado o direito da categoria a uma aposentadoria. Assim como o funcionário administrativo, de piso de R$ 400, na verdade ele virou um teto de R$ 400, porque está tudo incluído, qualquer gratificação, qualquer diferença salarial, toda ela foi engolida pelo dito piso de R$ 400. O governo devia fazer uma propaganda diferente, em vez de dizer que nenhum funcionário ganha menos de R$ 400, deveria dizer que nenhum funcionário ganha mais de R$ 400, porque essa é a realidade na rede estadual. No município do Rio também, o prefeito eleito era contrário às políticas do Fernando Henrique e aplica o mesmo receituário neoliberal. Tivemos em janeiro deste ano um seminário promovido pelo Banco Mundial e pelo Inep, para secretários de educação, onde estranhamente a gente viu pesquisas feitas pelos técnicos apontando que os salários dos professores da rede pública estavam acima da média do mercado, que estavam ganhando, por sua formação, um salário acima do das pessoas com o mesmo nível no mercado. Mas que mágica eles fizeram? Essas pesquisas são muito subjetivas, na verdade, depende do enfoque que você já traz, de onde você quer olhar e você vai chegar a determinados resultados.

A gente se perguntava como é que o professor da rede estadual está ganhando acima da média do mercado com nível de formação de terceiro grau, se ele tem piso de R$ 151. Eu falo por mim. Tenho 16 anos de magistério, sou enquadrada, tenho mestrado e o meu piso salarial é de R$ 176. Quem tem que ter vergonha disso é o Governo do Estado, não sou eu. A gente costuma dizer que a escola pública só está aberta hoje pelo entendimento que a categoria tem do valor social do seu trabalho, porque senão ela já teria fechado. Muita gente sai do magistério todo dia, todo mês. E ao contrário do que governos sucessivos dizem, elas são capazes, elas vão à luta, se formam, procuram aumentar sua formação e a contrapartida não está sendo verdadeira. O governo não tem investido no salário desses profissionais, pelo contrário, sempre se mantêm as políticas de gratificação. Parece que o governo acreditou naquela pesquisa que o Inep e o Banco Mundial apresentaram. Nós ficamos chocados, nós estamos financiando níveis de pesquisa que estão contradizendo anos e anos de prática social. E a desculpa dos governos de oposição para manter este tipo de política de gratificações que exclui aposentados é que somos uma categoria numerosa. A gente pára para olhar, mas é numerosa por quê? Por que a gente quer que seja numerosa? Não, porque é necessária. É uma categoria numerosamente necessária. Senão as escolas não funcionam. E, no entanto, a gente pode dizer que temos a metade do número necessário, porque nós trabalhamos com turmas superlotadas.

A gente encontra turmas de alfabetização com 40 alunos na sala de aula. Isso é bastante complicado. Nós temos um número até abaixo do necessário para o funcionamento com uma qualidade maior, porque o ideal seria turma com 20, 25 alunos de quinta à oitava e no Ensino Médio. É uma categoria numerosamente necessária para se manter esse direito da população à educação pública, esse é o primeiro ponto. O segundo, embora nós discordemos do projeto federal, o Fundef (NR: Fundo Nacional do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério), que temos certeza de que é excludente, só pega de primeira à oitava série. Não prevê financiamento da educação infantil, porque vemos a educação como um todo. Da pré-escola, da creche até a pós-graduação, para nós tem que ser um sistema. E não prevê as pontas do sistema, nem do Ensino Médio, nem da educação infantil, então para nós é um projeto excludente logo de cara. Mas os governos têm ganhado dinheiro com o Fundef, o município do Rio de Janeiro tem ganhos altos com o Fundef e até hoje não vimos uma prestação de contas convincente, porque o salário do professor no município do Rio também tem uma série de penduricalhos. Por que tudo não foi transformado em piso salarial? No Estado do Rio de Janeiro, quando o Fundef foi implementado em 98, no governo Marcello Alencar, foi aprovada na Assembléia Legislativa uma diferenciação de ICMS, porque o governo dizia que ia ter prejuízo com o Fundef. Então aumentou ICMS de cigarros, de bebidas, de uma série de produtos no Rio para cobrir este prejuízo. Cobriu o prejuízo e atualmente parece que recebe bastante dinheiro do Fundef. A gente precisou fazer uma greve em 1998 para haver uma gratificação de R$ 164 a mais no nosso contracheque. A gente tem visto, tanto no estado quanto no município do Rio, constantemente manchetes em jornais e revistas dizendo que têm aumentado a arrecadação, que tem dinheiro.

O Rio de Janeiro recebeu do estado royalties do petróleo, há dois anos mais de R$ 1 bilhão tem entrado e quando é que a educação vai ver a cor desse dinheiro? Quando é que os profissionais da educação vão ser realmente valorizados, quando vão deixar de ter um piso de R$ 151? Você tem que remar contra a maré de um projeto que diz que tem que achatar salário, pagar de acordo com a produtividade, que aliás é o projeto Nova Escola. No município do Rio de Janeiro também tem premiação por produtividade. Aí a gente se pergunta: o que é produtividade na educação? Como você faz esse translado de termos da economia, de fábricas e leva para dentro da escola? Escola não é fábrica e aluno não é mercadoria. E nem nós estamos lá apertando parafuso, para dizer que nós estamos formando tantos por ano. Essa é nossa produtividade, a quantidade de alunos que a gente aprova. Aí você paga por produtividade e, por extensão, diz que o aposentado é improdutivo. Qual é a produtividade do funcionário? Quantos banheiros ele limpou? Quantas salas ele varreu? Quantas panelas de merenda fez? São coisas que não têm como mensurar numa escola. Você não pode medir por número o trabalho de um professor, de um funcionário em uma escola.

Os projetos são pautados na produtividade e se esquece de valorizar a categoria como um todo no seu piso salarial. Não é a produtividade, não é o fato de a escola chegar ao padrão máximo e receber R$ 400 de gratificação, como é o caso da Nova Escola, que vai fazer que o professor e o funcionário trabalhem mais. No município do Rio de Janeiro, na primeira gestão do prefeito Cesar Maia, ele também deu um prêmio por produtividade para 200 professores e está tentando repetir isso, mas se esquece de fazer uma discussão da categoria de uma forma mais geral. Por que uma escola produz e a outra não produz? O governo está naturalizando diferença de qualidades e aponta para a população que existem cinco níveis diferentes de escola. Vai ter escola nível cinco para toda a população? Não vai. Então a população também está sendo roubada no seu direito de ter escola de qualidade.

Uma diretora do sindicato trabalha em duas escolas diferentes, faz o mesmo trabalho numa escola e na outra, e numa escola é nível 4, na outra é nível 2. Como? É a mesma professora, é a mesma formação. Dá aula para as normalistas, dá aula para a formação de professores, e no entanto recebe salários diferentes de uma escola para outra. Esses projetos não valorizam, eles não remam contra a maré do achatamento, do projeto neoliberal de dar uma série de penduricalhos no salário e roubar o direito à aposentadoria do trabalhador. Eles não fazem diferente disso, pelo contrário, vêm corroborar com essa visão neoliberal. Há dois anos que o governador não recebe os professores. Ele prometeu a incorporação de uma das gratificações. É pouco o que a gente está pedindo. Se incorporasse as gratificações hoje ao piso salarial do magistério, o nosso piso salarial seria de R$ 630. Não é nada estapafúrdio. E um funcionário, incorporando tudo, R$ 400. E não fomos recebidos pelo governo. O governo não diz nada, não se coloca, não tem proposta. O município do Rio de Janeiro também não tem o costume de negociar com a categoria.

Fonte:http://www.folhadirigida.com.br/professor2001/cadernos/base_futuro/21.html

12 de out. de 2007

Choque de gestão, o charlatanismo grandiloqüente

A fala do presidente Lula, quando expressou, há alguns dias, em alto e bom som, que choque de gestão, na sua visão, era criar empregos e oportunidades (ou algo nessa linha) foi manipulada e descontextualizada, de maneira capciosa, pela grande imprensa, de sorte que, ao final, ficou parecendo que o presidente havia dito uma enorme sandice, uma temeridade que sugeria “irresponsabilidade” e “incompetência” – o que não é, em absoluto, verdade. Não utilizarei esse espaço para defender as palavras mal ditas pelo presidente, mas para questionar esse remédio amargo vendido como verdadeira panacéia por muito charlatão engravatado que circula por aí vestindo a fantasia de homem público competente e probo – travestindo assim a realidade, a verdade dos fatos.

Em seguida, logo após a repercussão das palavras de Lula no noticiário, esses veículos, estrategicamente, abriram espaço para tucanos emplumados abrirem o bico e exibirem as cores enganadoras de sua plumagem. Li, dentre outros, um artigo do governador Aécio Neves, um outro do economista Yoshiaki Nakano (guru desse, vamos dizer, “chocante” modo de governar tipicamente tucano) e mais um punhado de alguns outros colunistas e articulistas. Esses últimos, jornalistas muito bem remunerados pelo exercício da sabujice aos “donos do poder”, confortavelmente abrigados na grande imprensa – onde mais?

No caso específico do artigo do governador (reeleito em seu estado, diga-se), o que se vê é mera propaganda enganosa, cujo repertório de “argumentos” reduz-se à enumeração e divulgação de supostas (e questionáveis) realizações de seu governo. Os demais fazem uma costura, muito mal cerzida, um arrazoado de sofismas muito mal “arrematado”. Questiono, por exemplo: pode se considerar mérito de algum governo pagar os salários de seus funcionários – e, veja bem, pagar “em dia”! O artigo do governador diz ser meritório. Caberia uma pergunta: os funcionários públicos de MG têm recebido reajustes salariais que contemplem, pelo menos, a recuperação das perdas inflacionárias? Isso também – a exemplo de pagar em dia – deve ser considerado apenas mera obrigação de qualquer governante. Não há mérito algum nisso. Ou estou equivocado? Pelas informações e notícias que me chegam, o funcionalismo público de Minas Gerias há muito não recebe reajuste salarial. Aliás, vale frisar, o tratamento dispensado aos servidores públicos nas gestões tucanas é baseado em princípios nocivos, desrespeitosos, desumanos mesmo. Os tucanos, como se sabe, são os mercadores monopolistas dessa grife mentirosa e vazia do “choque de gestão”.

A ministra Dilma Roussef foi uma das poucas vozes, no governo e no PT, sensatas e ponderadas o suficiente, para dizer, com rara propriedade, clareza e assertividade (característica essas tão raras nas nossas autoridades), que “choque de gestão” é mero recurso de propaganda. Ponto final. Touché, ministra!

O tal “choque de gestão”, emblema da (in)competência tucana na gestão da coisa pública, propiciou, só para citar um exemplo, que as concessões de exploração das estradas paulistas se realizassem com a custa de pedágios altíssimos, escorchantes mesmo. O mesmo processo, agora tocado pela ministra Dilma (a mesma que trata com o devido desdém o tal “choque de gestão”), parece ter obtido resultados muito mais favoráveis ao erário e aos usuários das nossas estradas. É só comparar as tarifas de pedágio cobradas nas estradas paulistas e as que serão cobradas nas estradas federais – uma vez que a comparação entre serviços prestados só poderá ser feita quando esses serviços efetivamente começarem a ser prestados, por óbvio. Sim, o modelo, eu sei, é diferente – mas enfim não seria esse o melhor modelo?

“Choque de gestão” é apenas uma expressão de efeito, grandiloqüente, cara aos charlatões com suas drogas milagrosas. Mera malandragem retórica, completamente destituída de sentido ou conteúdo. É uma ferramenta para o marketing político – apenas isso. Na cidade de São Paulo, o marketing político, do à época prefeito Paulo Maluf, teve a “sacada genial” de construir, às margens das principais avenidas (portanto, com máxima visibilidade), prédios populares batizados, com efeito, de “Cingapura”. Esses prédios eram construídos em terrenos onde antes existiam favelas – existiam e continuariam a existir, esclareça-se. A estratégia era a seguinte: construía-se ali dois ou três prédios, resolvia-se assim o problema de uns poucos sem-teto do local. O restante daquela população permaneceria na mesma favela, ali mesmo nas cercanias, agora oculta/escondida pelo portentoso prédio. A verdade estava por detrás da bonita e providencial edificação. Perceberam a jogada? Mas qual seria então a verdade/realidade que procura ocultar esse famigerado biombo do “choque de gestão”. Reflitamos sobre isso.

Você sabe, o que diferencia o remédio do veneno é a dosagem. Da mesma maneira, uma descarga elétrica controlada pode salvar uma vida e reanimar um ser humano à beira da morte. Mas uma descarga elétrica pode também eletrocutar um indivíduo, levando-o a morte. Da mesma maneira o tal “choque de gestão” pode, isto sim, levar à falência do Estado ou da máquina pública – em vez de melhorá-lo(a) ou aperfeiçoá-lo(a).
A estratégia de gestão tucana é, por todos, sobejamente conhecida. Conduzem, paulatinamente, os órgão e empresas do Estado à ruína: cortam recursos para investimento e custeio, demitem funcionários e, aos poucos que restam, pagam salários vis e desanimadores. Salários baixos traduzem-se em baixa produtividade, pois, como conseqüência imediata desse estado de coisas, vai fosso abaixo a auto-estima dos funcionários, levando-os ao desalento e a mais completa falta de motivação. Mas, aos olhos da sociedade, a culpa será sempre dos servidores “preguiçosos”, “que não gostam de trabalhar”. Os gestores tucanos fazem isso, não somente por incompetência ou porque são maus gestores; fazem-no para debilitar a estrutura do Estado e assim justificar/legitimar futuras terceirizações e privatizações – fontes sub-reptícias e primeiras do caixa 2 que virão a irrigar e fortalecer a máquina partidária. Estabelece-se assim uma promíscua e providencial relação de simbiose (ou seria parasitismo?) entre o público e o privado.

Devemos, por exemplo, de saída fazer a seguinte pergunta: qual a produtividade que desejamos? Seja na esfera do funcionalismo público ou do privado. Aquela produtividade que visa, em primeiro lugar, o bem-estar do trabalhador ou aquela que visa tão-somente o acúmulo de capital – levando a mais-valia a um, antes impensável, paroxismo? Sim, pois existem, pelo menos, dois tipos de produtividade. A deletéria (ou produtividade ruim), que é aquela que é incentivada também, claro, com intuito de se obter redução de custos, mas que é obtida a qualquer custo, pagando-se o preço (altíssimo) da deterioração da saúde do trabalhador: o estresse e outras complicações e transtornos emocionais? Ou a produtividade boa, que é aquela obtida quando se propicia ao trabalhador boas condições de trabalho e salários mais justos? No “choque de gestão” tucano, ou nas empresas do chamado “hiper-capitalismo” predatório, com sua sanha voraz, um trabalhador chega a fazer o trabalho de três ou quatro como resultado de um “enxugamento” progressivo do quadro de pessoal.

Essa fórmula/receita gerencial e a “competência” dos gestores tucanos, capatazes do neoliberalismo ou do “hiper-capitalismo” predatório, é por demais conhecida e não tem nada a ver com eficácia, eficiência ou competência administrativa (ou de gestão). É por demais batida: cortar gastos e investimentos, reduzir os custos com pessoal (por intermédio de cortes ou congelamento de salários), comprometer (sabotar) a qualidade dos serviços prestados, terceirizar e privatizar.

Os paulistas já sentem na carne os efeitos do “choque de gestão” tão propalado pela grande imprensa e posto em prática na gestão Geraldo Alckmin – como foi na de FHC e, agora, na de José Serra. Desnecessário dizer (ou relembrar) aqui das condições em que se encontram hoje a educação, a segurança e a saúde pública no estado de São Paulo. Isso sem falar no desmonte/destruição realizado no patrimônio público e na máquina de um modo geral. Não à toa Alckmin, bem como seus correligionários, em geral não sabem dar uma resposta ao rótulo de “privatistas” ou debater gestão pública com a necessária seriedade.
Com a palavra os cidadãos dos estados de Minas, São Paulo e Rio Grande Sul. Esses poderão nos dizer, com mais propriedade, o que vem a ser esse tal “choque de gestão”.




Lula Miranda é economista, poeta e cronista. É secretário de Formação para a Cidadania do SEEL – Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de SP. Integra o Coletivo de Formação da CUT São Paulo.

Papelão da imprensa

Papel da imprensa

Reportagem não precisa ter contraditório e ampla defesa

A imprensa não é obrigada, antes da divulgação de uma notícia, a fazer profunda investigação sobre a sua veracidade, se estiverem ausentes quaisquer indícios caluniosos, difamatórios ou injuriosos. Da mesma forma, o jornalista não é obrigado a submeter sua matéria a mais ampla defesa e ao contraditório, nos moldes do que acontece em um processo judicial.

O entendimento é da 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Em decisão unânime, o TJ-MT negou recurso ajuizado pelo ex-prefeito de Barra do Garças, Wanderlei Farias Santos.

O ex-prefeito recorreu da sentença de primeira instância, que negou o recurso contra uma empresa de comunicação do município, o apresentador do programa de televisão, o repórter e um professor entrevisto para a reportagem.

O apresentador levou ao ar uma reportagem produzida por um repórter, que tratava de irregularidades no convênio da Prefeitura com o Fundo de Educação. Na reportagem, o repórter tratou da abertura de uma sindicância administrativa criada pelo governo do Estado para apurar eventuais irregularidades na execução do convênio. Um entrevistado, no caso o professor, afirmou que teriam sido desviados R$ 80 mil dos cofres públicos.

Na ação, o prefeito afirmou que a matéria tinha caráter meramente eleitoreiro e que foi feita para alavancar a candidatura do proprietário da emissora de televisão à prefeitura do município. Disse, ainda, que os comentários feitos em relação ao convênio não correspondem à realidade, pois o repórter teria aumentado significativamente o valor do convênio com propósito de caluniá-lo e provocar sua desmoralização. Os argumentos não foram aceitos.

Para o relator, juiz Luiz Carlos da Costa, os réus não praticaram qualquer ofensa à honra do ex-prefeito ao esclarecerem ao público o que entendiam como má administração dos bens públicos. “Não se vê na reportagem clara intenção de desprezo”, afirmou.

O juiz destacou, ainda, que a imprensa não está obrigada, antes de divulgar qualquer reportagem, de submetê-la ao contraditório e a mais ampla defesa, própria de processo judicial.

Também participaram do julgamento o juiz substituto de 2º grau Antônio Horácio da Silva Neto (revisor) e o desembargador Evandro Stábile (vogal).

Revista Consultor Jurídico, 27 de setembro de 2007